Transgênicos: Superar o atraso e seguir em frente
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Por Luiz Lourenço(*)
O prolongado desenrolar de um embate que envolve setores representativos da sociedade brasileira sobre os alimentos geneticamente modificados (OGMs) parece estar chegando ao fim. A recente decisão da Justiça de liberar o plantio de soja no País é sinal claro de que os argumentos que tanto protelaram o avanço da biotecnologia à nossa agricultura já não têm mais sustentação. Resta-nos agora, contudo, aguardar pela aprovação da Lei da Biossegurança no Congresso Nacional.
Enquanto Estados Unidos e a vizinha Argentina permitiram que essa conquista da ciência fosse difundida amplamente, o Brasil consumiu alguns anos em debates apaixonados, o que levou produtores a adotar por conta e risco o cultivo de transgênicos - situação essa indesejável, haja vista o emprego de perigosas variedades clandestinas, conseguidas através de contrabando.
Dessa forma, enquanto respeitados representantes da comunidade científica internacional posicionavam-se favoráveis ao emprego de OGM, inclusive para consumo humano, mais de 10% da safra brasileira de soja (e 70% no Rio Grande do Sul) foram cultivadas na safra passada com sementes transgênicas.
Quem compara o desempenho das exportações para a Europa de farelo de soja entre brasileiros e argentinos, nos últimos anos, pode observar claramente que os compradores não impõem restrições aos transgênicos. Se em 1995 as exportações argentinas de farelo de soja totalizaram 6,887 milhões de toneladas, o volume saltou para 16,525 milhões de toneladas em 2002. No mesmo período, as exportações brasileiras de farelo de soja passaram de 11,563 para apenas 12,517 milhões de toneladas em 2002. Em outras palavras: a soja geneticamente modificada da Argentina está, ano após ano, abocanhando mercado da soja convencional do Brasil.
Para os agricultores, o cultivo de soja transgênica é interessante porque significa melhor manejo, um controle de ervas mais eficaz e menor desembolso em relação às lavouras convencionais. Com custo inferior, a atividade torna-se mais competitiva em um mercado cada vez mais profissional. Os sojicultores do Paraná têm um custo de produção 13% maior que o de seus colegas argentinos. Uma diferença dessas pode acabar significando a perda de novas fatias de mercado, abalando toda uma cadeia produtiva.
Não há nada que estimule o plantio de soja convencional. Preço diferenciado ou garantia de compra por parte dos importadores, isto não existe. Além disso, produzir soja convencional é cada vez mais difícil em razão das rigorosas exigências de rastreabilidade, que demandam investimentos em estruturas e pessoal capacitado, o que encarece o produto.
Por sua vez, há vários pontos favoráveis ao cultivo de OGMs. O primeiro deles, o próprio ambiente, haja vista que com tais lavouras diminui-se consideravelmente a necessidade de aplicação de agroquímicos, poluidores por excelência. Isto reduz, ao mesmo tempo, o tráfego de máquinas, a emissão de fumaça na atmosfera, o pisoteio das lavouras e a compactação do solo.
Como toda novidade, valoriza-se em excesso, no Brasil, mitos de que os plantadores de transgênicos acabariam reféns de algumas poucas empresas fornecedoras de insumos, o que também não é verdade. A cada ano, cresce o número de fornecedores - a Embrapa, por exemplo, já teria uma dúzia de variedades de sementes de soja adaptadas às condições brasileiras. Se o produtor se sentir prejudicado, não há o que lhe impeça retornar ao cultivo de sementes convencionais.
O mercado para os transgênicos é cada vez maior e absolutamente irreversível. Hoje, pelo menos 51% de toda a soja cultivada no mundo já é geneticamente modificada e a tendência é que esse percentual continue crescendo.
O futuro da humanidade, afinal, depende dos avanços da engenharia genética, esta uma das maiores descobertas que envolvem todos os seres vivos do planeta. A biotecnologia nos possibilita aumentar de forma quantitativa e qualitativa a oferta de alimentos, através da criação de maior resistência a pragas, doenças e até mesmo intempéries. Da mesma forma, presta valioso serviço à medicina ao promover alterações da qualidade nutricional de alimentos. Entre elas, o enriquecimento de óleos saturados e a produção de cereais e frutas direcionadas para a prevenção de males. Um exemplo, o arroz geneticamente modificado que produz beta-caroteno, precursor da vitamina A.
Imagina-se no futuro a convivência pacífica de vários tipos de produtores em um mesmo mercado, divididos em setores específicos. Além dos OGMs, propriamente, teremos os que continuarão plantando lavouras convencionais e também os produtores de orgânicos, estes cada vez mais em voga.
É preciso, pois, sacudir a poeira, superar o atraso e seguir em frente.
(*) Presidente da Cocamar Cooperativa Agroindustrial de Maringá