SUSTENTABILIDADE: O ABC da sustentabilidade na agricultura
- Artigos em destaque na home: Nenhum
A agricultura sustentável deixou de ser apenas um desejo de ambientalistas e passou a ser realidade em muitas lavouras do Brasil e do mundo. O entendimento de que é mais eficiente fazer uma agricultura utilizando menos recursos é quase unanimidade nos centros de pesquisa e o resultado são novas tecnologias aparecendo a todo momento para beneficiar o produtor e facilitar a sustentabilidade no campo. Após a COP 15 - Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas, realizada em Copenhagen (capital da Dinamarca), em 2009, o Governo brasileiro assumiu o compromisso público de reduzir as emissões de gases estufa em 38% e criou o Programa ABC (Agricultura de Baixo Carbono), um plano de metas específico para a área rural que contempla seis grandes áreas: plantio direto, fixação biológica de nitrogênio, recuperação de áreas degradadas, plantio de florestas, Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF) e tratamento de resíduos animais. O programa promete mudar a realidade da agricultura brasileira.
Entrevista - Para entendermos melhor o Programa ABC, que está em andamento há 1 ano, o Portal Dia de Campo conversou com exclusividade com o Chefe da Assessoria de Gestão Estratégica do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Derli Dossa, doutor em ciências econômicas, que era o coordenador do programa até o final do ano passado e ajudou a elaborar as metas que contemplam o plano. Ele explicou as principais metas, falou sobre os principais desafios e disse que o novo modelo sustentável é inevitável, veio para ficar e vai elevar ainda mais o patamar da agricultura brasileira.
Portal Dia de Campo - O senhor pode explicar como surgiu e qual é o objetivo principal do Programa ABC?
Derli Dossa - Ele vem dentro de um enfoque de mudança de modelo de agricultura. Antes, no modelo de agricultura tradicional brasileira, não havia preocupações com a emissão de gases de efeito estufa. Em função de um ligeiro aumento na temperatura média no globo terrestre, há necessidade que a gente identifique os focos que causam esse problema. O Programa ABC nada mais é do que um programa que tem objetivo de fazer uma agricultura de baixa emissão de carbono, para contribuir com a melhoria do clima na Terra. É resultado do compromisso que o Brasil assumiu em Copenhagen para desenvolver um modelo de agricultura sustentável.
Portal Dia de Campo - Quais são as seis tecnologias que compõem o Programa ABC?
Dossa - Esse modelo de agricultura sustentável é baseado em seis tecnologias fundamentais. A primeira delas é a recuperação de áreas degradadas, em que até 20120 nós temos a meta de recuperar 15 milhões de hectares. A segunda tecnologia é o Plantio Direto na Palha, que é uma tecnologia já muito utilizada no Brasil e conhecida pela maioria dos produtores, já que dos 47 milhões de hectares que tínhamos em 2009, 26 milhões utilizavam plantio direto. A nossa aumentar é expandir esse número para mais 8 milhões de hectares. Nosso terceiro objetivo é a implementação de um modelo de agricultura diversificado a que chamamos de Lavoura-Pecuária-Floresta. Esse modelo já é muito conhecido na agricultura familiar, mas vem sendo também incorporado pela média e grande agricultura, dia após dia. Outra tecnologia dentro do plano é a fixação biológica de nitrogênio. Retiramos o nitrogênio da atmosfera (através da chuva e de uma bactéria fixadora de nitrogênio no solo), incorporamos no solo e ele vai fazer com que haja um aumento na matéria orgânica no solo. A quinta é o plantio de florestas porque nada recupera mais o CO2 da atmosfera do que o plantio de árvores. Finalmente, tem o tratamento de dejetos, em que nós vamos transformar o gás carbônico proveniente dos dejetos dos animais.
Portal Dia de Campo - Em qual destas áreas até agora houve maior e menor progresso?
Dossa - Elas estão há menos de um ano em execução. Dessas atividades a que tem chamado mais atenção é a ILPF, todavia a área de Plantio Direto é a que avançou mais rapidamente, mas é normal que isso ocorra.
Portal Dia de Campo - Quais são as principais dificuldades que o programa enfrenta?
Dossa - Nós não temos todos os números ainda e temos duas deficiências fundamentais: a primeira é que, como nós estamos mudando de modelo, os técnicos não têm tanta segurança para afirmar aos produtores o ganho efetivo e a rentabilidade financeira. Estamos destravando esse problema a partir da elaboração de cursos de treinamento para técnicos e produtores. Precisamos ainda produzir muita matéria de divulgação na imprensa, porque as informações que chegam aos produtores são muito poucas. Eu diria que mais de 90% dos produtores ainda não conhecem o programa. Nós temos segurança de que em um período de três anos estas duas dificuldades estarão superadas.
Portal Dia de Campo - Em que Estados está mais fácil implantar os programas e em qual está mais difícil?
Dossa - Os mais fáceis estão sendo aqueles que nós estamos priorizando, que são Goiás, Tocantins, Paraná e Minas Gerais. Eu creio que a Região Centro-Oeste será a que mais vai implementar porque, no meu entendimento, é ali que nós temos maior necessidade que avance rapidamente esse novo modelo de agricultura.
Portal Dia de Campo - Como vai funcionar essa questão do financiamento para o produtor?
Dossa - O crédito não é problema porque nós colocamos volume de recursos suficiente já em 2010/2011 e estamos colocando agora em 2011/2012 cerca de R$ 2,3 bilhões com taxa de juros a 5,5% ao ano com prazo de carência de 5 a 8 meseS tendo até 15 anos para pagar, dependendo do projeto técnico. Os financiamentos já estão em andamento. O Banco do Brasil, por exemplo, priorizou entre as suas metas que os gerentes coloquem recursos na emissão de baixo carbono. Nós não estamos colocando mais dinheiro para fazer o mesmo, nós queremos mudar o modelo de agricultura e temos o objetivo de tornar a agricultura mais eficiente e de melhor gestão. Por isso a gente exige o projeto técnico.
Portal Dia de Campo - Falando especificamente da área de tratamento de resíduos de animais. O objetivo é tratar 4,4 milhões de metros cúbicos, principalmente da suinocultura, e transformar estes resíduos tóxicos em energia. O Governo vai construir ou incentivar as usinas de tratamento pelo país?
Dossa - Nas regiões de suinocultura, o esforço vem sendo feito pela Itaipu Binacional. Os técnicos de lá é que têm coordenado o processo de implantação desse modelo da área de dejetos suínos. O Ministério de Desenvolvimento Agrário também está coordenando essa área.
Portal Dia de Campo - Quando se fala em sustentabilidade, agricultura sustentável, redução de gás carbônico, muitos produtores não dão muita importância porque não enxergam os benefícios econômicos. Mas muitas dessas ações trazem lucro para os produtores. Eu gostaria que o senhor abordasse esse aspecto financeiro.
Dossa - No nosso entendimento essa é uma questão de educação e na frente será uma questão cultural. Nossa proposta é que eles façam melhor o que já sabem fazer. Essa agricultura que está sendo proposta é a agricultura que levou o Brasil a ser o segundo maior exportador do mundo e altamente competitivo. Nós estamos querendo melhorar o processo de gestão, fazer com que a gente utilize melhor os recursos da agricultura. A contabilidade será feita no momento da elaboração do projeto. Sustentabilidade é um termo genérico, mas o que tem por trás disso nada mais é do que a compreensão de que nós precisamos fazer mais com menos. Significa que nós estamos atrás de ganho de produtividade em função do melhor uso de tecnologias disponíveis na Embrapa, nas instituições regionais de pesquisa, nos centros acadêmicos e universidades. Nós já estamos antecipando barreiras comerciais que virão por parte dos países importadores, onde a preocupação com a pegada de carbono no mundo já é grande.
Portal Dia de Campo - Dentro de 10 anos, o que o senhor espera para o Programa ABC, como o senhor gostaria que as metas do programa estivessem?
Dossa - Esse é um processo em andamento e a gente espera que ele tenha mais informações divulgadas e mais gente aderindo. Eu acredito que, dada a idade em que tenho hoje (64 anos), que será um programa das futuras gerações. Os meus filhos é que vão introduzir com grande força esse novo modelo de agricultura sustentável. É um modelo que veio pra ficar, fazendo com que o homem não seja um predador da natureza, mas sim um participante da sustentabilidade. (Portal Dia de Campo)