SUCROALCOOLEIRO I: Usinas perdem fonte de financiamento
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As empresas de certificação e gerenciamento de risco estão se recusando a aceitar a administração dos chamados "títulos colaterais", oferecidos em garantia a empréstimos bancários e lastreados em estoques para algumas usinas de sucroalcooleiras, segundo apurou o Valor. Essa recusa preocupa, uma vez que pode secar uma das poucas fontes de financiamento disponíveis no mercado ao setor. Também pode comprometer o programa de "warrants", anunciado na semana passada pelo governo, que prevê a estocagem de álcool durante a colheita da cana.
Motivo - Essas empresas alegam que algumas usinas têm utilizado os estoques comprometidos para honrar compromissos de curto prazo. Isso é considerado uma prática ilegal. As certificadoras atuam como fiel depositário desses estoques. Sem o aval delas, as instituições financeiras não concedem o empréstimo.
Exigentes - As empresas emissoras desses títulos estão mais exigentes. Algumas usinas não pagaram os financiamentos e as seguradoras, que garantiam os papéis, também recuaram, deixando de contratar apólices para esses títulos. O mercado encolheu mesmo com a necessidade dos bancos de trocar as garantias oferecidas em alguns empréstimos. Alguns bancos restringiram as operações a clientes especiais. Outros, deixaram de operar com títulos colaterais.
Critérios - "Com a crise, o mercado está analisando a carteira e escolhendo com quer operar", diz o presidente da certificadora Control Union, Benjamin Bourse. Ele afirma que a demanda por colaterais cresceu porque os bancos tentam melhorar as garantias com a oferta de estoques e lavouras. "Muitas empresas tiveram ´default´, algumas pararam de fazer esses serviços porque não tinham seguro."
Risco - Líder no mercado de emissão de colaterais, a Control Union também ficou mais avessa ao risco. "Não paramos, mas estamos selecionando ainda mais os nossos clientes. Muitas vezes dizemos não, porque o risco de alguns bancos cresceu muito com a crise", diz Bourse. A Control Union monitora cerca de 1 milhão de hectares de lavouras de cana, ou seja, 15% da área total do país, e tem US$ 3 bilhões garantidos em títulos colaterais, como "warrants", serviços de fiel depositário e monitoramentos. "Quem financiava commodities foi muito agressivo. Primeiro, com juros baixos. Depois, aceitando garantias menores e colaterais." O Valor apurou que a SGS, uma das principais certificadoras globais, estuda deixar de fazer esse tipo de operação. Procurada, a empresa não comenta o assunto.
Confiança - A confiança nas operações foi quebrada por alguns desvios nos estoques. "Não tivemos problemas com troca de estoques porque trabalhamos em sistema de 24 horas por sete dias com três funcionários em turnos de oito horas", afirma Bourse. Antes, exigia-se monitoramento 24 horas dos estoques e lavouras. "Hoje, passou-se a monitorar uma vez por ano. Não é só nosso nome que está em jogo, mas os altos valores envolvidos." Com isso, muitas empresas saíram do mercado e os bancos passaram a demandar a troca de garantias. Fontes do setor informam que uma empresa europeia chegou a fechar seu departamento de colateral no Brasil por causa de problemas com estoques na África.
Escassez de crédito - Esses título colaterais vinham garantindo alguma liquidez ao setor, que enfrenta escassez de crédito por conta da crise financeira global. Sem essa linha, a torneira de crédito fecha de vez e pode levar algumas usinas à falência, segundo fontes. Essa prática de utilizar os estoques dados em garantia já é velha conhecida no mercado, segundo essas mesmas fontes. "As usinas confiam que os estoques serão repostos assim que a nova safra tiver início", afirma outra fonte.
‘Warrants'- No mercado, já há preocupações com o programa de "warrants" do governo. Esse programa, que prevê a liberação de R$ 2,5 bilhões para financiar a estocagem de até 5 bilhões de litros de etanol pelas usinas, é considerado vital para a manutenção dos preços do combustível durante o pico da colheita de cana no Centro-Sul do Brasil em patamares acima dos custos de produção. Sem certificadoras confiáveis no mercado para monitorar estes estoques, o programa fica comprometido. (Valor Econômico)