RAMO SAÚDE II: Demanda e inadimplência cresceram e venda parou

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Mesmo com a tímida recuperação a partir de junho, o primeiro semestre de 2009 marcou um dos piores períodos da história para as operadoras de planos de saúde. Dificuldades de acesso ao crédito e problemas de caixa, ambos derivados da crise financeira global, somaram-se à significativa elevação de 6% da demanda da clientela por cobertura no período, estagnação nas vendas de novas apólices e aumento de 4% na inadimplência de empresas patrocinadoras de planos coletivos e empresariais.

Suspensão temporária - Essa situação levou algumas companhias a pedir, de forma pontual, suspensão temporária dos contratos com as operadoras. Entre estas, algumas optaram por renegociar e parcelar seus débitos com hospitais e outras aumentaram o prazo da chamada "glosa", medida rotineira tomada para auditar e questionar procedimentos eletivos feitos por prestadores de serviços, como clínicas e hospitais.

Brasília - Em Brasília, quatro dos 13 hospitais credenciados suspenderam atendimento pela operadora Cassi, vinculada ao Banco do Brasil. Sob o argumento de dívidas não pagas e desentendimentos sobre reajustes da remuneração de procedimentos médicos, os hospitais Santa Lúcia, Prontonorte, Daher e Santa Helena cortaram o plano. "Mas não é má vontade ou intransigência nossa. Não podemos comprometer o equilíbrio do plano", diz o presidente da Cassi, Antonio Sergio Riedi, que contabiliza 825 mil clientes e 38 mil prestadores de serviço no país.

Crise - O cenário de aperto financeiro das operadoras começou com o agravamento da crise. Com medo de perder o emprego e, consequentemente, o benefício do plano de saúde, muitos trabalhadores anteciparam procedimentos de cirurgias mais simples, como hérnias e varizes, além de check-ups de rotina. Isso formou uma bolha de demanda que elevou o custo dos planos. Faltaram caixa e crédito, dizem fontes do setor.

Abramge - A Associação Brasileira de Medicina de Grupo (Abramge), que reúne 270 operadoras de planos de saúde, contabilizou os problemas do primeiro semestre e disse que agora depende dos índices de emprego para reverter os resultados. "Não foi catastrófico, mas foi ruim. Houve um aumento na 'sinistralidade', o que foi bom para hospitais, laboratórios e indústria farmacêutica. Mas quem paga essa conta são os planos", afirma o presidente da Abramge, Arlindo de Almeida, também diretor da Samcil. "A média da 'sinistralidade', que fica ao redor de 70%, aumentou quatro pontos percentuais, ou 6%. O resultado dos planos diminuiu", diz ele, que representa associados como Medial, Amil, Golden Cross e Intermédica. O executivo informa que a "estagnação" do primeiro semestre nasceu do aumento nos índices de desemprego. "Isso porque 73% dos planos são coletivos ou empresariais." Na média, até março deste ano, "alguns perderam e outros ganharam", segundo Almeida. "Ocorreu uma crise de crédito grande. Bancos e financeiras não descontavam duplicatas, reduziram empréstimos e isso influiu no caixas das empresas."

No vermelho - Somadas despesas administrativas e impostos, o executivo aponta que alguns planos devem "fechar no vermelho" em 2009. "Dependemos dos índices de desemprego para uma recuperação. O efeito das demissões só vem seis meses ou um ano depois, porque as empresas mantêm o plano médico como benefício." A Cassi admitiu enfrentar "problemas pontuais" em Brasília, Boa Vista (RR) e Santa Cruz do Sul (RS). "Não tivemos ganhos, mas também não tivemos perdas significativas", explicou Sergio Riedi.

Mesmo diagnóstico - Dirigentes do setor hospitalar têm o mesmo diagnóstico do setor. Membro do Conselho Deliberativo da Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp), que reúne 38 empresas com faturamento de R$ 6 bilhões, José Ricardo de Melo diz ter havido aumento no prazo das "glosas". "Há certa demora dos planos. Se é uma política de caixa das operadoras, não posso afirmar. Mas o prazo passou de 45 para 70, 80 dias", atesta.

Atraso - Segundo ele, que também preside o Hospital Santa Rosa, em Cuiabá (MT), houve atrasos nos pagamentos das faturas pelas operadoras. "Pontualmente, algumas atrasaram mais. Alguns hospitais também tiveram que parcelar dívidas dos planos. Mas existe uma negociação entre os setores que tem dado resultado". Melo diz, ainda, que "estava havendo discrepância" entre valores pagos e faturados, "sobretudo em número de dias".

Exceções - Não são todos os prestadores de serviço, contudo, que dizem encontrar obstáculos para receber das operadoras. Marco Fábio Sinisgalli, diretor geral do grupo hospitalar Nossa Senhora de Lourdes, na capital paulista, afirma que até agora não houve problema de pagamento - seja atraso ou inadimplência - com quaisquer dos 80 planos de saúde conveniados. A Dasa, maior rede de medicina diagnóstica do país, também informa que não vê dificuldades com as operadoras nas regiões onde atua. "Não temos visto variações por parte dos planos em função da crise", afirma Antonio Carlos Gaeta, vice-presidente de negócios da companhia. "Ao contrário, a consolidação do setor nos últimos anos fez uma depuração econômica das empresas, melhorou o mercado, e hoje temos relações bem estáveis com as operadoras", diz.

Práticas corriqueiras - Para Paulo Roberto Cretella, do hospital Villa Lobos, na zona leste de São Paulo, são práticas relativamente corriqueiras dos hospitais parcelar determinadas contas para as operadoras ou negociar com elas o recebimento do que é apontado como glosa. "Não é algo de hoje, nem reflexo da crise", diz. Sinisgalli, embora não considere comuns as práticas de facilitar pagamentos aos planos, afirma que tudo depende do peso de uma operadora dentro do total de clientes do prestador. No Nossa Senhora de Lourdes, nenhum convênio tem participação superior a 10%, afirma. (Valor Econômico)

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