Palestra de Sardenberg: Os muitos obstáculos da economia
- Artigos em destaque na home: Nenhum
Embora a situação econômica do país seja muito superior à dos últimos dois anos, há muitos obstáculos a serem superados para que entre numa fase de estabilidade. O principal problema é que o governo continua gastar mais do que ganha e, continuando assim, nunca vai apresentar uma situação econômica confortável. Essa afirmação foi feita ontem em Curitiba, pelo jornalista Carlos Alberto Sardenberg, em palestra aos dirigentes do Sicredi, sob o tema "Brasil, recuperação e obstáculos". Adiante apresentamos a continuidade de resumo de sua fala, mostrada ontem neste informativo.
A situação é melhor, mas o pessimismo aumentou - A situação econômica atual é melhor que dos dois últimos anos, mas ainda assim não cria novos empregos, pois as empresas estão utilizando a mesma estrutura para aumentar a produção. Ainda não estão seguras para contratar mais gente. É resultado do pessimismo que se instalou, uma vez que as perspectivas positivas do final do ano passado não se concretizaram. O perigo é Lula ficar impaciente ao ponto de tomar atitudes populistas diante desta crise, mudando tudo, mas com reflexos negativos na economia.
Sem acordos comerciais, a economia fica patinando - Sardenberg mostrou aos dirigentes do Sicredi um quadro muito interessante para mostrar a influência dos acordos comerciais na recuperação econômica. Ninguém cresce se não fizer acordos comerciais (Alça, Nafta, UE e outros). Mas tem que fazer bons acordos, onde os dois lados saem ganhando. Para comprovar que sem acordos o Brasil não melhora, o jornalista mostrou tabela com a evolução das exportações nos últimos 8 anos, da qual mostramos apenas três anos. Os números são auto-explicativos.
Tabela 1 ? Evolução das exportações - Brasil e países que realizaram acordos comerciais |
|||
Ano |
Brasil |
México |
Canadá |
1994 |
US$ 44 bilhões |
US$ 61 bilhões |
US$ 165 bilhões |
1999 |
US$ 48 bilhões |
US$ 136 bilhões |
US$ 238 bilhões |
2002 |
US$ 60 bilhões |
US$ 160 bilhões |
US$ 270 bilhões |
O risco Brasil é maior - O Brasil saiu da crise profunda mas não construiu a base para um crescimento duradouro. Por que? As razões são várias, começando pela inflação, ainda alta, mesmo a 5,5%. Sardenberg mostrou que dos 25 países emergentes, apenas seis têm inflação por volta de 5,5%, Os outros 19 têm inflação de até 3%, como o México, cuja economia está melhor que a do Brasil. Outro problema é a "medida de risco", que é o cálculo de quanto da exportação o país precisa para pagar sua dívida externa. O Brasil precisa de 2,8%, contra apenas 0,83% do México; 0,47% da China; 0,66% da Coréia do Sul e 1,3% da Rússia. A dívida pública do Brasil também está bem acima do padrão aceitável, chegando a 58% do PIB, contra 22,7% do México.
Ainda há
muito governo, um sinal de atraso - Excesso de governo quer dizer burocracia,
freio ao desenvolvimento. Pior é a resistência às reformas
que podem colocar o Brasil num caminho mais rápido para o desenvolvimento.
Sardenberg citou como exemplo a Vale do Rio Doce, que tem 32 projetos de investimentos
prontos, para os quais têm recursos inclusive internacionais assegurados.
Mas não são executados porque esbarram nas questões ambientais
(Ibama) ou burocráticas. Esses projetos, se executados, podem gerar milhares
de empregos sem exigir novos investimentos do governo federal. O mesmo ocorre
no saneamento, onde não se avança nas reformas necessárias
para que o setor atraia investimentos privados porque os setores públicos
não permitem avanços. "No governo há bolsões
que ainda acreditam que o governo vai controlar tudo, o que é um sinal
de atraso", frisou o jornalista.
Lula e os três cenários- "O Lula não era o que
se imaginava. Montou um programa econômico novo e se reverteu o que deu
errado em 2002", comentou Sardenberg sobre o presidente. E quase ao final
de sua conferência traçou três cenários possível
da economia brasileira: 1- O arranjo está certo. É só uma
questão de tempo. 2- Vai dar tudo errado. E Lula fica impaciente, muda
tudo e cai no populismo. 3 - Nem tanto ao céu, nem tanto á terra.
Acerta aqui, erra ali e a economia vai caminhando.
Andando sem o governo - "Grande parte das coisas se faz sem o governo. Se as cooperativas esperassem o governo, não teríamos dinheiro aqui", afirmou referindo-se ao ressurgimento das cooperativas de crédito, mesmo contra a vontade de setores do governo. "Se o agro esperasse o governo, estaria perdido. E o que salvou o Brasil foi o agronegócio". Respondendo a pergunta formulada por Manfred Dasembrock sobre a economia Argentina, disse que o país empobreceu 30% nos últimos anos e que, fruto do excesso de estado, as empresas energéticas estão quebradas''. E aproveitou para mostrar que o presidente Lula age de maneira mais profissional que seu colega argentino. Enquanto o presidente Kirchner briga irracionalmente com o FMI, Lula negocia e consegue pequenos avanços.
Os "outros"
problemas - A Previdência, que tem um rombo previsto de R$ 30 bilhões
neste ano sem considerar "o aumento mixuruca do salário mínimo"
e o MST são dois grandes problemas do governo. O MST não quer,
efetivamente, a reforma agrária. "É um movimento contra o
agronegócio". O movimento acha um erro exportar. "É
um movimento político de extrema esquerda. Como lidar com isso?"
Pergunta Sardenberg. E levanta uma questão: "Como lidar com antigos
aliados que estão atrapalhando? A trégua (com o MST) encerrou-se.
O que o governo irá fazer. Romper? O MST está dentro do governo",
concluiu depois de dizer que a maioria dos acampamentos do movimento fracassou.
Como anda a economia - O jornalista chamou a atenção para
a perda do poder aquisitivo da população brasileira, que no ano
passado foi de 13,7%, conforme mostra a tabela seguinte, onde é possível
observar o comportamento dos principais índices da economia.
Quadro 02 ? Evolução dos principais índices da Macroeconomia Brasileira.
Índices - % |
2000 |
2001 |
2002 |
2003 |
2004* |
Inflação - % |
5,90 |
7,70 |
12,50 |
9,50 |
6,00 |
PIB - % |
4,40 |
1,30 |
1,90 |
- 0,20 |
3,50 |
Juros Reais** |
10,70 |
8,90 |
5,90 |
12,80 |
9,00 |
Dólar ? dez. - US$/R$ |
1,96 |
2,32 |
3,53 |
2,89 |
3,10 |
Saldo comercial*** |
- 0,70 |
2,65 |
13,14 |
24,80 |
24,00 |
Conta Corrente**** |
- 24,22 |
- 23,20 |
- 7,70 |
4,10 |
0,40 |
IED***** |
32,70 |
22,40 |
16,50 |
10,00 |
12,90 |
PEA****** |
7,1 |
6,2 |
11,7 |
12,4 |
10,5 |
Massa rendimentos real - % |
- |
-3,10 |
-1,80 |
-13,70 |
6,90 |
Fonte: Apresentação Carlos Alberto Sardenberg ? 30/03/2004
* Previsões do Bacen ? Mar/2004.
** Juros reais (taxa Selic menos a taxa de inflação).
*** Saldo da balança comercial (bilhões de US$).
**** Saldo em conta corrente (balança comercial e balança de pagamentos em bilhões de US$).
***** IED - Investimento externo direto no Brasil (bilhões US$).
****** População economicamente ativa (taxa de desemprego).