Por
Alda Lerayer (*)
Na semana passada, o Greenpeace divulgou um relatório afirmando
que a Europa rejeita alimentos transgênicos. Esta informação
equivocada prejudica o entendimento da biotecnologia no Brasil e confunde
os leitores e consumidores com relação aos produtos geneticamente
melhorados (GM). Ao contrário, as plantas GM são cultivadas
em escalas cada vez maiores nos países europeus. Na Espanha, a
área cultivada de milho GM aumentou 80% de 2003 para 2004, atingindo
80 mil hectares. Os franceses também cultivam milho transgênico,
conforme reportagem do jornal Le Figaro publicada na primeira semana de
setembro. No País já existem hectares de plantio de milho
transgênico, frente aos inexpressivos 17,5 hectares em 2004. E no
mundo, a área cultivada com plantas transgênicas já
ultrapassou 81 milhões de hectares.
Não se justificaria, portanto, tamanho aumento da produção
se não houvesse demanda de mercado. Tomemos como exemplo o caso
da soja e dois dos maiores exportadores mundiais, Estados Unidos e Argentina,
que, junto com o Brasil, são responsáveis por mais de 80%
de toda a soja produzida no mundo. Na Argentina, 95% dos plantios de soja
são GM, enquanto que, nos Estados Unidos, esse percentual é
de 81%. De acordo com informações da Céleres, empresa
de consultoria em agronegócio, de janeiro a junho de 2005 as exportações
mundiais de farelo de soja da Argentina aumentaram em 15% com relação
ao mesmo período do ano anterior. Além disso, os dados apontam
que, especificamente para a União Européia, as exportações
de farelo cresceram 17%. Já as exportações de soja
em grão da Argentina aumentaram nesse período em torno de
38%. A Céleres informa também que a União Européia
comprou 50% a mais de soja em grão oriunda dos Estados Unidos,
de setembro de 2004 a maio de 2005, em comparação ao período
anterior. E para o mundo, o crescimento nas exportações
de grãos de soja dos Estados Unidos foi de 21%. Importante ressaltar
que, atualmente, na Europa o mercado para ingredientes a base de soja
e milho certificados como não GM é de, respectivamente,
14 a 17% e 25 a 29% do total. Ou seja, a, maior parte dos ingredientes
derivados dessas duas plantas usados nos alimentos comercializados na
União Européia, é oriunda de plantas transgênicas.
Os dados por si só mostram que a Europa não tem restrições
aos transgênicos, especialmente se considerarmos que a soja é
comercializada como commodity, plantada, conduzida, colhida e vendida
sem segregação pelos três maiores produtores mundiais.
Além da soja, o milho é plantado em versões transgênicas
e são matérias-primas utilizadas em aproximadamente 75%
dos alimentos industrializados no planeta. Grande porcentagem de soja
e milho GMs é usada em rações para animais que entram
direta ou indiretamente na cadeia alimentar e estão presentes em
muitos dos produtos comercializados na Europa como isentos de transgênicos.
Tudo isso sem contar outros ingredientes e aditivos como enzimas, vitaminas
e aminoácidos, produzidos a partir de microrganismos transgênicos
que estão presentes na maioria dos alimentos industrializados.
Essa informação aparentemente está sendo omitida
e usada para identificar o que seria um mercado isento de transgênicos.
É a livre escolha que define a demanda. É o livre mercado
que dá as cartas no jogo do comércio mundial. Não
defendemos de forma alguma os transgênicos como única opção
de cultivo. Defendemos o oferecimento de diferentes opções
para sistema produtivo, de forma que os agricultores brasileiros possam
ter competitividade no mercado mundial e, a partir dessa competitividade,
escolher a tecnologia que lhes trará maior lucro, mesmo que seja
para ocupar o que hoje são nichos de mercado para produtos isentos
de transgênicos. E, para que esses nichos sejam atrativos economicamente,
é preciso que haja cultivos e fornecedores de plantas geneticamente
modificadas no mercado. Para tudo isso acontecer de modo transparente
e fluente devemos regulamentar, o quanto antes, a Lei de Biossegurança
do Brasil.
*Secretária-executiva
do Conselho de Informações sobre Biotecnologia (CIB)
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