Marcos Jank mostrou \"uma janela de oportunidade\"

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O professor Marcos Jank, diretor do Icone - Instituto de Estudos de Comércio e Negociações Internacionais, falou sobre "A evolução das negocaições para a criação da Área de Livre Comércio das Américas". Afirmou que as possibilidades de negociar o acesso aos mercados "abre uma janela de oportunidade", chance que pode não se repetir. Falando sobre o fórum, considera extraordinário que tenha sido realizado e "gostaria que isso estivesse acontecendo todo o dia em algum lugar do Brasil". Frisou que todo mundo sabe que a grande dificuldade para o agronegócio crescer é o acesso aos mercados, "a competição predatória com outros países. Esse é um setor tipicamente caracterizado por isso. Nós temos uma infeliz coincidência: nós nos tornamos eficidente, extremamente eficientes, exatamente naqueles grupo pequeno de produtos que o mundo mais protege. Isso nos torna reféns das negociações. Então, temos que fazer um trabalho mais coordenado. É a oportunidade... - eu tenho sempre destacado isso em minhas palestras - nós temos uma janela de oportundiades entre 2002 e 2005, que é a triplice negociação. Acho que as pessoas não se deram conta disso, ainda, dentro do agronegócio. Existe, neste momento, uma oportunidade concreta de acontecer alguma coisa que pode nos abrir grandes oportunidades lá fora. E isso vai acontecer agora. Talvez a gente nunca mais na história, a gente vai ter essa mesma janela". Veja, a seguir, a posição de Marcos Jank a respeito das negociações internacionais, em entrevista ao informativo Paraná Cooperativo:

Paraná Cooperativo - Como o Brasil deve se comportar perante as negociações da Alca? Deve participar ou sair das conversações?

Marcos Jank - O Brasil deve permanecer na Alca. É uma integração de 34 países latino-americanos lançado pelos Estados Unidos, mas onde os americanos não puseram, até agora, muito cacife político e tão pouco fizeram concessões que satisfizessem países como, no caso, o Brasil. O Brasil tem algumas resistências porque tem competitividade em certas áreas que teme que não façam parte do acordo. Então, tem que jogar até o final essa partida. A decisão tem que ser tomada em função do acordo que for proposto. A idéia de sair só por sair só traz perda, pois existe uma possibilidade da Alca acontecer, mesmo que efeitos ruins podem acontecer mesmo a Alca não aconteça. Por exemplo, há risco de haver explosão de acordos bi-laterais nas Américas, comandados pelos Estados Unidos, que podem vir a nosso desfavor. Então, temos que permanecer na negociação e tentar ter uma Alca positiva, que pelo menos é uma posição melhor.

PC - A equipe do Governo Lula está preparado para as negociações?
Marcos Jank - O governo Lula, pelas características do PT, tem mais resistências que o governo anterior. E particularmente na área da Alca. Curiosamente, há uma pressão no governo - com a qual eu não concordo - de que seria mais fácil negociar com a Europa do que negociar a Alca. No meu ponto de vista, as negociações da Europa sempre foram reativas à Alca. Ou seja, se a Alca não avançar, vai ser mais difícil ainda negociar com a União Européia. Eles são muito mais protecionistas que os EUA, em todos os sentidos. Na área de acesso aos mercados eles têm muito mais produtos protegidos por tarifas altas. Eles usam muito mais cotas tarifária, as barreiras tarifárias têm crescido de maneira muito mais espantosa na União Européia, e o nível de subsídios também é muito mais alto, subsídios domésticos e subsídios de exportação, pois os europeus são campeões em subsídio à exportação, que é o pior tipo de subsídio. Então, não há nenhuma razão para achar que a negociação com eles será mais fácil do que com os americanos. Infelizmente corre-se o risco de não ver nenhuma frente acontecer e, pior, ver a explosão de negociações bilaterais com vizinhos nossos, nas nossas fronteiras, que podem ser muito prejudiciais. Estamos numa situação em que temos que negociar em todas as frentes.

Paraná Cooperativo - Como o Brasil tem se portado frente a esses mercados e como tem que se portar?
Marcos Jank - Nós temos uma característica importante: a gente critica diariamente os subsídios europeus e americanos - com razão, pois são danosos para o Brasil - mas ainda critica de maneira superficial. Poucas pessoas mergulharam na agenda para saber exatamente montar uma estratégia. É uma deficiência do agronegócio em não montar uma estratégia mais clara do que deve ser pedido, é razoável como resultado em cada uma das frentes. Falta exercício nesse sentido.E há uma ignorância muito grande sobre o terceiro mundo. Por exemplo, no Brasil não há especialistas em China e Índia. Eu conheci lá fora vários especialistas em mercados específicos e aqui não temos isso. Eu tenho tido oportunidade de ler textos sobre estes paises, levantar dados. A gente precisaria estar considerando com muito maior rigor estas possibilidades de acordos com países populosos. A Frente Asiática, por exemplo, eu acho que deveria ser melhor considerada.

Paraná Cooperativo - Faz apenas uns dez anos que o Brasil começou a se familiarizar com negociações internacionais. Como o governo está preparado para isso, tem um quadro de pessoal preparado?
Marcos Jank - A gente pode olhar usando a parábola do copo de cerveja pela metade: olhar sob uma ótica otimista ou pessimista. A ótica otimista é lembrar que dez anos atrás a gente não sabia o que era, GATT, o que era integração, o Brasil era uma economia em processo de abertura, mas sem nenhuma preocupação ofensiva. A preocupação era mais defensiva. Quando se vê o que aconteceu em dez anos, a conscientização sobre o problema, a priorização do problema dada pelo governo, foi um enorme progresso. Mas existe um lado pessimista que é o seguinte:apesar desse progresso, as nossas estruturas de negociação são muito deficientes se comparadas com a de outros países. A pesquisa é quase inexistente, muito precária em termos de levantamento de barreiras, subsídios, estratégias dos outros países. Para negociar com EUA e Europa a gente tem entender como é que funciona a gestão da política internamente, qual o papel do congresso, quais os lobbies organizados que há lá foram. Esses tipos de pesquisa praticamente inexistem no Brasil e a coordenação do governo com o setor privado é muito precária. É uma coordenação muito mais de troca de informações do que parceria, de construção, de posicionamento. Acho que temos que avançar nessas duas frentes.

Paraná Cooperativo - Qual é o papel das lideranças do setor do agronegócio nessas negociações. É de ficar só na torcida? As lideranças estão participando dessas negociações ou estão vendo passivamente, esperando que alguém faça alguma coisa, ou ficam só na torcida?

Marcos Jank - Aqui, é a velha história do copo de cerveja pela metade, onde o otimista diz que tem metade e o pessimista que já foi metade. Ou seja: há progressos enormes, como os dois exemplos, a criação da coalisão empresarial brasileira, que definiu uma posição do setor privado, criou-se um mecanismo de consulta mais permanente e no caso específico da agricultura, o Fórum Permanente de Negociações da CNA. Abag e OCB. São grande progressos. Mas por outro lado há deficiências. Por exemplo, eu estou comandando esse novo instituto que é uma associação sem fins lucrativos de interesse público, com objetivo de fazer pesquisas em termas de negociação. Esse instituto não tem nada de novo, é uma cópia de institutos semelhantes que existem em países importantes em agricultura, a começar pela Austrália, que é o que mais investiu nisso. E estou pensando em países médios, pois a gente nunca vai conseguir ter o nível técnico e gente como a Europa e EUA têm. Mas se a gente conseguir fazer o que a Austrália, o México, o Chile e a Nova Zelândia fazem, eu acho que já é um avanço, pois eles criaram mecanismos de negociação muito mais intensos do que o Brasil. Então, como dizia, estamos tentando criar aqui um instituto, e no momento em que a gente vai tentar buscar um financiamento junto ao setor, a gente tem dificuldades. Ainda falta muito em termos de papel político do governo e setor privado na coordenação desse trabalho. Nós temos que fazer pesquisas, pois é o elemento crucial para o entendimento do processo.

Investigação - Como são várias frentes de negociação você não vai conseguir resolver nenhum problema, integralmente, num só local. Você vai ter que conseguir o melhor resultado no conjunto das negociações. E para saber qual é o melhor resultado, você precisa fazer pesquisa onde investiga as práticas protecionistas de cada país com quem você está negociando. Nota-se que são 34 países na Alca, 15 mais 04 países na União Européia e Mercosul; e são 146 países na OMC (Organização Mundial do Comércio). Portanto, estamos falando num volume considerável de dados que têm que levantados para ter um bom resultado nessas negociações. Eu não estou aqui só para defender a pesquisa, pois ela é um elemento. Ainda acho que a coordenação entre governo e setor privado é até mais importante em curto prazo. Mais pro final da rodada a pesquisa vai ser absolutamente central.

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