FÓRUM ECONÔMICO I: Crescimento e novos desafios marcam encontro em Davos
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À saída de uma mesa de debates anormalmente movimentada para um último dia do Fórum Econômico Mundial, no sábado (29/01), o vice-presidente da Comissão de Planejamento da Índia, Montek Singh Ahluwalia, falou em "cauteloso otimismo", o bordão mais popular em Davos, neste ano, ao definir, para o Valor, qual a sensação geral entre os participantes do encontro que reuniu por quatro dias na Suíça boa parte da elite mundial. "A situação é melhor do que esperávamos, mas há desafios à frente", disse. "Curioso. Essa é exatamente a frase que o general David Petraeus usou para definir a situação no Afeganistão", emendou, rindo de si mesmo.
Comparação - A comparação inconsciente com o general que fez um relatório ufanista sobre a ação militar dos Estados Unidos no Afeganistão na semana passada, deixando de lado a catástrofe em que está mergulhado o país, tem alguma razão de ser. Aliviados com o fim do temor de volta da recessão em 2010, os organizadores de Davos tiveram de montar às pressas, no sábado, o debate do qual saía Ahluwalia. O tema: Tunísia, país de onde se originou uma revolta popular contra governos corruptos na África que, durante a semana, engolfou também o Egito.
Crise egípcia - Na quinta-feira (27/01), Yasmine Allam, a assessora de imprensa do ministro do Egito, Rachid Mohamed Rachid, telefonou ao Valor para informar que o egípcio havia cancelado a entrevista com o jornal, marcada na semana anterior, porque desistira de ir a Davos. Dois dias depois, caía o gabinete de ministros, em meio a tumultos e mortes nas ruas do país. Até sábado, quando passou a um dos temas principais, a crise egípcia, comentada discretamente nos corredores, tinha recebido atenção limitada em poucas das mais de uma centena de sessões de debate e palestras do Fórum.
Temas - Os temas que despertaram mais atenção foram a vitalidade das economias emergentes, especialmente China e Índia; a recuperação do crescimento dos Estados Unidos, às custas de gigantesco déficit público que chegou a ser comparado a "um elefante debaixo da mesa"; as queixas dos banqueiros contra o que consideravam uma demonização dos bancos fomentada pelos governos; e as dúvidas sobre o futuro do euro e dos governos europeus dobrados por rombos nas contas públicas - situação que, para irritação da ministra da França, Christine Lagarde, o presidente do banco Barclays, Robert Diamond, disse ter passado de aguda, no ano passado, para "crônica", neste ano.
Exemplo - O tumulto político egípcio serviu em Davos como exemplo das reações inesperadas nas ruas a problemas não identificados como prioritários pelos radares do Fórum Econômico. Motivada em parte pelo aumento nos preços dos alimentos, mas principalmente pela rejeição popular a regimes autoritários e corruptos, a crise egípcia, por pressão dos jornalistas presentes, foi tratada em algumas declarações de governantes e se insinuou num painel de discussão, no sábado, sobre as previsões de especialistas e acadêmicos.
Delicado - No debate, o ex-vice-presidente do Banco Mundial e ex-secretário-geral adjunto da ONU Mark (lord) Malloch-Brown, da consultora FTI, disse apenas que o assunto era delicado demais para se cobrar recomendações saídas de Davos. O ex-presidente do México, Ernesto Zedillo, ao lado de Malloch-Brown, advertiu aos que torcem pela derrubada da ditadura egípcia de que os resultados podem ser maior instabilidade na região. "Cuidado com o que desejam", comentou, prevendo problemas em países do Oriente Médio, como Síria e Jordânia caso fosse de fato derrubado o governo do Egito.Frustração - "O cidadão árabe está zangado e frustrado; o nome do jogo é reforma", disse na sexta-feira (28/01) o secretário-geral da Liga Árabe, ex-ministro de Relações Exteriores do Egito, Amr Moussa, que, num dos primeiros painéis do Fórum, frustrou com um discurso genérico quem esperava que discutisse os acontecimentos na África.
Alívio - Apesar da nota sombria deixada pelas incertezas políticas no fim da semana, a reunião de Davos foi marcada, em geral, pelo clima de alívio com a volta do crescimento norte-americano e as boas perspectivas das economias emergentes, especialmente China e Índia. "Há bem mais otimismo, isso aqui no ano passado parecia um enterro", reconheceu o presidente da Embraer, Frederico Curado.
Calote - Nos quatro dias de debates, foi possível ouvir discursos veementes de diferentes autoridades europeias garantindo apoio político para evitar o calote das dívidas soberanas dos países mais afetados pela crise na Europa e explanações sobre como a China deve lidar com a ameaça de uma "bolha especulativa" gerada pelo crescimento do país. Mas, como o caso do Egito, muitos temas delicados foram apenas mencionados pelos especialistas reunidos com parte da elite mundial, como o perigo de crise da dívida no setor privado de uma Europa estagnada e o risco de nova crise hipotecária nos EUA, devido à permanência das altas taxas de desemprego. (Valor Econômico)