EXPORTAÇÕES DO COMPLEXO SOJA
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Fernando Henrique Cardoso
Presidente da República
Ref.: Tributação das exportações de soja
Qualquer tentativa de tributar as exportações de soja, conforme solicitação de alguns governadores, irá reduzir ainda mais a competitividade da soja brasileira, abrindo espaço para aumentar o crescimento das exportações da Argentina e dos Estados Unidos no mercado mundial da soja. De acordo com análises da Ocepar/OCB, os efeitos negativos de uma possível taxação das exportações da soja, conforme pleito dos governadores ao Presidente Fernando Henrique Cardoso, sob o argumento de perda de receita com ICMS, irá marginalizar o Brasil no comércio internacional do complexo soja, pelas razões colocadas a seguir.
EXPORTAÇÕES DO COMPLEXO SOJA
As exportações do complexo soja vêm mudando de perfil nos últimos anos, com aumento dos embarques de grãos e redução do farelo e óleo, como mostra a tabela 1, abaixo.
TABELA 1 - EXPORTAÇÕES DE SOJA EM GRÃO, FARELO E ÓLEO - BRASIL
A mudança do perfil das exportações está ocorrendo em virtude das dificuldades de colocação do óleo e farelo no mercado internacional, especialmente o óleo, no qual a concorrência com os demais óleos se acirrou, em decorrência, ocorreu queda substancial de preços. De acordo com os dados demonstrados na tabela 2, abaixo, verifica-se que a receita obtida por tonelada exportada de óleo sofreu redução drástica de 1998 para 2001, passando de US$ 530 para US$ 320 por tonelada, que representa uma queda de 40%. A queda de preço do óleo puxou para baixo também o preço do farelo, conforme se observa na mesma tabela, a receita com o farelo caiu de US$ 268 para US$ 175 por tonelada, ou seja, redução de 34%.
TABELA 2 - RECEITAS OBTIDAS COM EXPORTAÇÕES - BRASIL
O aumento das exportações da soja em grão, a partir de 1997, deve-se principalmente pela dificuldade de colocação do farelo e óleo no mercado internacional, aliada ao aumento da produção brasileira em 31%, que exigiu a busca por novos mercados, bem como devido à cobrança do ICMS nas operações interestaduais mesmo para o produto destinado ao processamento para posterior exportação.
Tributação
A Lei Complementar nº 87, de 13/09/96, estabeleceu a isonomia de tratamento tributário das exportações de produtos primários e semi-elaborados com os produtos manufaturados, aumentando assim a competitividade dos produtos agropecuários. Com isso, o Brasil alavancou as exportações de produtos de origem agropecuária em volume e valor.
Especificamente em relação ao complexo soja, houve significativo aumento nas exportações, as quais passaram de 16,2 para 22,0 milhões de toneladas no período de 1996 a 2000.
Ocorre, todavia, que foram instituídos novos tributos e artifícios tributários ou de ordem administrativa, que comprometem os ganhos proporcionados com a desoneração das exportações, tais como:
- Cobrança do ICMS nas operações interestaduais quando a soja em grão é industrializada em outro estado para posterior exportação;
- Incidência do PIS/Cofins e CPMF em operações entre empresas com alíquota agregada de 4%;
- Pagamento ao Fundo de Transporte e Habitação no Mato Grosso, em valor de R$ 3,11/tonelada, equivalente a 1,3%, e ao Fundo de Desenvolvimento do Sistema Rodoviário no Mato Grosso do Sul, no valor de R$ 2,58/tonelada ou equivalente a 1%.
- Instituição do sistema de pedágio nos principais corredores de exportação que onerou, em média, 3% o valor do produto.
A indústria brasileira paga o ICMS na compra de soja em grão de outros estados, porém, acumula créditos posto que não há incidência do Imposto na exportação dos produtos.
Restrições ao comércio internacional
O comércio internacional da soja é tarifado pelos principais importadores. Na China há incidência de tarifa de 3% no grão, 5% no farelo e 112% no óleo. No Japão, US$ 20/t no óleo. Na União Européia a proteção é de 6,4% no óleo.
Já nas exportações, a Argentina taxa as exportações da soja em grão em 3,5%, não cobra nada no farelo e incentiva as exportações de óleo mediante devolução de impostos equivalente a de 1,4% a 10% do valor do produto (1,4% para óleo bruto, 3,2% para óleo refinado a granel e 10% para óleo refinado envasado). Nos Estados Unidos há um proteção de 19% no óleo e US$ 4,5/t no farelo.
Subsídios derrubam o preço internacional
A soja, o farelo de soja e o óleo de soja registram os preços mais baixos dos últimos 30 anos, em decorrência da concessão de subsídios à produção de soja nos Estados Unidos. O Programa chamado Loan Price Deficiency Payment garante ao produtor americano um preço de US$ 5,26/bushel, equivalente a US$ 193/tonelada, bem acima do preço de mercado dos últimos anos. Essa política de garantia de preços está provocando a elevação constante e continuada do plantio e quantidade produzida, gerando artificialmente um incremento expressivo de produção. Através do Loan Price, o governo paga ao produtor, em depósito na sua conta, a diferença do preço obtido no mercado e o preço de garantia de US$ 5,26/bushel.
Produção, preços médios da soja no mercado internacional e o Loan Price (preço mínimo) garantido pelo Governo Norte-Americano em (US$/Bushel).
Gráfico
A produção mundial de soja aumentou 27,91% de 1996 a 2000, passando de 132,2 para 168,1 milhões de toneladas. Os maiores aumentos ocorreram na Argentina que praticamente dobrou sua produção, com acréscimo de 10,3 milhões de toneladas, seguido dos Estados Unidos com aumento da produção de 12 milhões de toneladas, e Brasil, com 8,3 milhões de toneladas. No global a oferta mundial aumentou em 35,9 milhões de toneladas, enquanto o consumo aumentou em 32,0 milhões de toneladas.
Os gráficos seguintes demonstram a evolução da produção no mundo e nos Estados Unidos, Brasil e Argentina.
(Gráficos)
Conclusões
- A Lei Complementar nº 102, de 11/07/2000, garantiu o ressarcimento aos estados por eventual perda de arrecadação, e de acordo com Boletim do Banco Central, a arrecadação dos estados cresceu de R$ 67,8 bilhões em 1999 para R$ 82 bilhões em 2000.
- O preço recebido pelos produtores caiu 27% de 1997 para 2001, acompanhando a evolução das cotações internacionais.
- Os estados criaram artifícios em seus Regulamentos do ICMS, taxando as operações de transferência de Estado para produtos destinados à industrialização em outro estado, para posterior exportação.
- A alíquota do PIS/Cofins foi elevada de 2,0% para 3,0% em 1998.
- Foi criada a CPMF com alíquota de 0,38%.
- Instituídas cobranças de tributos em alguns estados, a título de fundo de transporte ou desenvolvimento, no Mato Grosso, de cerca de 1,3% e no Mato Grosso do Sul de 1% sobre o valor do produto.
- Foram criados sistemas de pedágio nos principais corredores de exportação que, em média, oneram o preço do produto em 3%.
É importante frisar que no cenário mundial do comércio do complexo soja, é consenso entre os três maiores produtores, que o Brasil é quem reúne as melhores condições para o crescimento da produção dentro dos padrões modernos de produtividade. As exportações da soja do Brasil devem ser beneficiadas em decorrência da entrada da China na Organização Mundial do Comércio, a qual terá que rever sua política protecionista, tornando nossa produção mais competitiva em seu mercado.
A possibilidade de haver alguma redução dos subsídios à produção na União Européia em decorrência da reforma da sua política Agrícola Comum - PAC e a tendência européia de aumento do consumo de produtos tradicionais, corroboram para a formação do consenso entre os três países produtores. Com isso, a produção brasileira poderá chegar a 50 milhões de toneladas dentro de alguns anos, gerando um incremento de cerca de US$ 3 milhões em exportações.
É preciso que o governo encabece discussões a fim de se estabelecer algumas diretrizes para o setor, dentre elas destacam-se as seguintes:
1) Modernização e realocação do parque processador nacional:
As fábricas existentes foram instaladas a mais de 15 anos, além de sua maioria estar localizada nos estados do sul e hoje a produção migrou para o centro-oeste. O diferencial tecnológico aliado ao tamanho das fábricas permite à Argentina processar o grão com custos inferiores em 1/3 em relação às fábricas brasileiras. A maioria das indústrias argentinas foram instaladas nos últimos 5 anos.
2) Corredores de exportação:
Neste ano, ocorreram filas de caminhões de mais de 100 quilômetros em alguns portos, onerando o produto com pagamento de sobrefrete da ordem de 25% e estadia dos caminhões equivalente a R$ 0,40/tonelada/hora.
3) Armazenagem:
O último programa para construção de armazéns data do início dos anos oitenta e de lá para cá pouco se fez. A falta de armazéns obriga os produtores a venderem suas produções durante a colheita, retirando a possibilidade da obtenção de melhores preços pela desconcentração da oferta.
4) Cultivo de soja transgênica:
Nos Estados Unidos cerca de 60% da área plantada é com sementes de origem transgênica e na Argentina 90%, o que proporciona redução significativa de custos. No Brasil a questão está em nível de judiciário. Não é possível continuar sendo proibido o cultivo no Brasil, deixando a Argentina e os Estados Unidos tomarem nosso mercado, pois os custos da soja transgênica são menores, enquanto o Brasil continua produzindo a soja tradicional e não recebe ágio de preço pelo produto tradicional.
Diante dessas considerações pede-se:
- Manutenção do sistema atual, conforme preconiza a Lei Complementar nº 87.
- Agilizar a discussão e aprovação da Reforma Tributária.
- Restabelecer o prazo de 360 dias no PROEX para exportações de óleo bruto e farelo, pelo BNDES.
- Instituição do regime draw back interno (verde-amarelo) para movimentação da matéria-prima do Estado produtor para o Estado processador, condicionada à exportação do farelo e óleo. Hoje, a exportação de soja em grão não tem incidência de ICMS (Lei Complementar 87-96), com o que se estimula a saída de matéria-prima do País sem agregação de maior valor.
- Atuar firmemente nas discussões na Organização Mundial do Comércio - OMC para se reduzir os protecionismos tarifários ou não-tarifários.
Finalmente, nos colocamos a disposição para em conjunto tratar de questões que visem a modernização do setor soja, a fim de que possamos reduzir custos e contrabalançar o protecionismo do mercado internacional.
Saudações Cooperativistas
João Paulo Koslovski
Presidente da Ocepar