“O
governo não pode mais ser irresponsável”
O paranaense Moacir Micheletto acaba de assumir a presidência da
Frente Parlamentar da Agricultura na Câmara Federal. Agrônomo
e cumprindo o quarto mandato como deputado federal pelo PMDB, Micheletto
anuncia que a primeira medida da comissão será reivindicar
à equipe econômica do governo Lula mais recursos para a agricultura.
Em entrevista à Gazeta do Povo, o deputado disse que se o governo
federal tivesse liberado o orçamento de R$ 1 bilhão previsto
para o setor agrícola neste ano o país não estaria
enfrentando essa crise sem precedentes.
Quais
os resultados práticos que a Frente pode conseguir?
Estamos marcando uma audiência com o presidente Lula e levando uma
agenda positiva. Entre os assuntos está o problema da febre aftosa,
a necessidade de maior controle fitossanitário e a regulamentação
da Lei de Biossegurança, que está na Casa Civil e ainda
não saiu. Vamos reivindicar ainda soluções para a
crise da triticultura e a aprovação do Código Florestal
Brasileiro, que está aprovado na comissão mista há
seis anos. Queremos ainda formar um grupo de parlamentares que possa tratar
a situação fitossanitária em conjunto com os países
do Mercosul para evitar que uma epidemia ou foco de doença em um
país atinja países vizinhos. Vamos tentar um ajuste parlamento
com parlamento. Além disso, vamos pedir ao governo que crie laboratórios
de vacina para doenças como aftosa. A idéia é estabelecer
um contato mais assíduo entre a Frente, a Comissão de Agricultura
da Câmara e a Frente do Cooperativismo com a equipe econômica.
Para que este contato?
O ponto mais importante é exigir que toda verba do orçamento
para agricultura destinada à fitossanidade animal e vegetal não
seja contingenciada. Vamos ter de ver a liberação do dinheiro.
O
corte de recursos no controle da sanidade animal foi a principal causa
do foco de aftosa?
Se o governo federal tivesse liberado o dinheiro o país não
estaria enfrentando essa situação. É uma realidade
que não tem como negar. Do dinheiro previsto no orçamento
deste ano para os estados, através do Ministério da Agricultura,
80% foi cortado. Agora estão sendo liberados R$ 90 milhões
de um orçamento que era de R$ 1 bilhão. O governo tem de
entender que as áreas de saúde e fitossanitária não
podem esperar.
E
o que a Frente Parlamentar pretende propor para forçar o governo
a cumprir o orçamento?
Temos de criar um mecanismo no Congresso Nacional para não haver
mais contingenciamento dos recursos. Só uma lei pode evitar cortes
e obrigar o governo cumprir o orçamento nas áreas estratégicas,
como saúde animal e vegetal. Essa é uma questão de
segurança nacional. O Congresso Nacional tem de aprovar já
para a peça orçamentária de 2006, um item que defina
que os recursos destinados à fiscalização e ao controle
da sanidade animal e vegetal, tenham de ser realmente aplicados sem a
interferência dos ministérios da Fazenda e do Planejamento.
Os recursos para essa área não podem ser liberados e cortados
ao mesmo tempo, como aconteceu nos anos de 2004 e 2005. Também
deve haver maior atenção do governo brasileiro junto aos
seus vizinhos de fronteira, como o Paraguai, a Bolívia e Argentina.
O controle animal e vegetal desses países é fundamental
para as pretensões comerciais do Brasil junto aos países
importadores, como a União Européia, os EUA e a Rússia.
Qual
é a estratégia para ampliar os investimentos na agricultura?
Fizemos um acordo com o presidente da Câmara, Aldo Rebelo, e toda
a bancada ruralista, para que ele seja o interlocutor junto ao presidente
da República. Aldo é sensível à agricultura
e à pecuária. Estamos trabalhando na prevenção
porque a crise maior será no ano que vem.
Por
que essa previsão?
O problema mais grave da agricultura é a política econômica
do governo. Falta dinheiro para comercialização, os produtores
rurais estão endividados e tem o problema do câmbio. Esse
tripé é que está provocando uma crise sem precedentes.
Tivemos seca no Sul do Brasil, mas estou até deixando de fora o
aspecto climático. O custo de produção interna, os
gastos com insumos, combustíveis e mão-de-obra na agricultura
são muito altos e provocam o endividamento. Atualmente temos mais
de 550 mil produtores rurais na inadimplência no país. No
Paraná, mesmo com todas as dificuldades e os enormes prejuízos
causados pela estiagem, poderá crescer 27% a produção
agrícola, chegando a 21 milhões de toneladas. Os produtores
paranaenses são a alma da economia do estado e mais uma vez demonstram
em trabalho eficiente.
Seguindo
esse raciocínio, o governo federal é o grande culpado pela
crise na agricultura?
No caso da aftosa, o Brasil não merece isso que está acontecendo.
Essa displicência do governo não pode existir mais. A equipe
econômica tem de colocar na cabeça que o agronegócio
é a grande alavanca econômica do país e isso não
pode falhar. A elite urbana que governa o Brasil tem vergonha de dizer
ao mundo que o Brasil tem vocação agrícola. Fábrica
de automóveis não é solução para o
país, é problema. O mundo precisa de comida e somos a grande
esperança nessa área. O Brasil pode produzir com qualidade
sem problemas como o da Vaca Louca. Nós, da bancada ruralista,
somos mal-interpretados porque enfrentamos esse contraditório.
A agricultura dá muito mais emprego que qualquer outro setor, R$
1 milhão aplicados na agricultura têm retorno muito mais
rápido que o mesmo dinheiro investido em comércio, bens
de serviços, industrialização. Damos de 10 a zero
nesse pessoal todo. Em 6 meses retorna tudo o que está sendo aplicado.
A China, desde 2000, está fazendo a maior reforma agrária
ao inverso, 250 milhões de chineses estão deixando o campo
e indo para a cidade, temos que conquistar esse mercado.
E
como conseguir isso?
Temos de ter uma ação rápida e convencer a equipe
econômica que o agronegócio representa muito para a economia
do que qualquer outro setor. Precisamos iniciar uma ação
internacional, acionar nossas embaixadas e interlocutores políticos
para mostrar que estamos fazendo tudo certo para combater a aftosa e que
o Brasil está preparado para isso. É uma questão
de responsabilidade, o governo não pode mais ser irresponsável
como foi.
No
caso do Paraná, o senhor acredita que os casos de aftosa serão
comprovados?
Precisamos aguardar os resultados dos exames, tudo isso está um
imbróglio que ninguém entende. Foram feitos 3 exames e ainda
não há segurança máxima para um parecer definitivo.
Como agrônomo conheço tudo isso e confio na segurança
dos nossos laboratórios, não tem corrupção
e eles vão ter que dizer a verdade. Se for negativa a presença
da doença temos que correr atrás do prejuízo e se
for positiva, vamos criar mecanismos para, em seis meses, recuperar o
mercado porque o mundo precisa da carne brasileira. A Nova Zelândia,
os Estados Unidos, a Argentina e a Austrália, por exemplo, não
tem estoques para seis meses. Essa é a nossa sorte.
Como
a Frente vai atuar em relação à gripe aviária
no país?
Estamos agendando uma audiência com o ministro da Saúde,
Saraiva Felipe, para tratar do plano de ação brasileiro.
O governo já adiantou que vai realizar pesquisas sobre vacinas
e planos de estoques de medicamentos, realizar campanha de esclarecimento
sobre a doença dirigida aos produtores de aves, limpezas químicas
dos calçados de passageiros que desembarquem em portos e aeroportos
do país, principalmente aqueles originários de países
asiáticos. Não podemos nem pensar em ter foco no Brasil
porque além da doença atacar os animais afeta a saúde
humana. |