EDITORIAL VALOR ECONÔMICO
- Artigos em destaque na home: Nenhum
O PROTECIONISMO AGRÍCOLA ESTÁ MUITO LONGE DO FIM
Os principais países desenvolvidos já traçaram seus planos agrícolas para os próximos anos e eles não trazem boas notícias para os exportadores brasileiros. A nova rodada de negociações multilaterais da Organização Mundial de Comércio, iniciada em Doha, acena com o objetivo explícito de redução de subsídios, barreiras tarifárias e não-tarifárias. Sem negar a priori a possibilidade de avanços nesta direção, tudo indica que se caminhará, mais uma vez, para o predomínio das políticas das nações ricas.
A União Européia acenou com uma mudança importante em sua Política Agrícola Comum, ao abandonar os subsídios dados diretamente à produção e voltá-los para o produtor. Mas nada mudará, a rigor, nos próximos cinco anos. O orçamento destinado às subvenções para o campo traz um montante de mais de US$ 44 bilhões (à cotação do dia, de um euro por dólar) para este fim, com uma redução ínfima da dotação em relação aos anos anteriores - algo em torno de US$ 300 milhões. Os especialistas apontam que a guinada da Europa -ainda incerta, pois enfrenta forte oposição do lobby agrário, comandado pela França - abre um caminho futuro para a renegociação dos subsídios.
A forma anterior garantia renda para o agricultor proporcionalmente à produção, o que significava que, independentemente das condições de mercado, teriam sustentação de preços. Na prática, uma diretriz que favorecia a superprodução e fechava um dos maiores mercados do mundo às exportações brasileiras e dos países atrasados em seu conjunto. A nova política representa um avanço, ainda limitado e inseguro, se for considerado o fato de que os europeus eram o país que mais distorciam os mercados mundiais com amparo excessivo aos preços agrícolas.
Outra ameaça, dependendo do uso que se faça da nova PAC, é a de que seus novos objetivos pontos como a justa proteção ao meio ambiente, possam servir politicamente de outra arma contra os exportadores de fora da União Européia, que vem sendo vastamente utilizada na guerra de mercados: as barreiras não-tarifárias.
A União Européia, porém, está rapidamente perdendo o título de campeã do protecionismo agrícola para os Estados Unidos. A Farm Bill americana garante a fortuna de US$ 180 bilhões nos próximos dez anos em subsídios ao campo, despejando mais de US$ 73 bilhões às dotações da lei anterior. Confirmando a vocação protecionista não apenas da nova administração de Bush, o Congresso está amarrando a proteção ao campo como precondição à "fast track", tentando isolá-la da licença geral para que o presidente negocie amplamente acordos comerciais. As regras de que acordos firmados pelo Executivo deveriam ser totalmente rejeitados ou totalmente aceitos pelo Congresso poderá deixar os subsídios agrícolas de fora - que, no limite, poderiam ser preservados inteiramente, a despeito das negociações fechadas.
Os efeitos dos subsídios são danosos para o acesso aos mercados. Premiam a ineficiência, introduzem falhas na formação dos preços, reduzem a competitividade e facilitam o ataque a outros mercados importadores em desigualdade de condições para os concorrentes. Obviamente, tal política é extremamente nociva ao Brasil que, com saltos significativos de produtividade, ganhou a condição de ser um dos países mais competitivos do mundo no setor.
Enquanto as barreiras criadas pelos subsídios não são levantadas, o Brasil, sem deixar de propagar sua política condenatória dos subsídios, em conjunto com o grupo de Cairns, está começando a levantar sistemas de proteção. Em posição comum com o Mercosul, iniciará o aumento da Tarifa Externa Comum para produtos subsidiados na origem, em outubro, conforme acertado na última reunião de ministros agrícolas do Mercosul. O primeiros alvos são o arroz e o algodão americanos. A iniciativa é uma réplica justa e a contrapartida ao protecionismo das nações desenvolvidas que, com seu avassalador peso político, têm conseguido impedir avanços significados rumo ao livre mercado para as commodities agrícolas.
(Fonte: Valor Econômico, 15/07/02).