China requer parceiros muito bem preparados

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Luiz Lourenço

Por ocasião da visita oficial do governo brasileiro à China, acompanhado de uma delegação de empresários, aquele país de dimensões continentais, cuja economia passa por rápido processo de crescimento, mereceu notório e até certo ponto exagerado destaque na mídia nacional, a ponto de se pensar que o Brasil tivesse, a partir daquele momento, escancarado um corredor para a exportação de quase todos os seus produtos. O importante contato entre as duas nações abriu, sem dúvida, um novo horizonte para a economia brasileira, que deve realmente investir na aproximação com aquele imenso mercado que, efetivamente, poderá vir a ser um comprador em potencial do Brasil, o qual participa com apenas 1% das importações chinesas.

Com 20% da população e somente 9% das terras agricultáveis do planeta, a China é um país emergente que precisa de quase tudo e tem apetite voraz para comprar. Na mesma velocidade com que arranha-céus são erguidos em megalópoles como Beijing e Xangai, milhões de chineses – mais de 2/3 deles ainda vivendo no campo – migram para as cidades, pressionando a demanda por alimentos. Aumenta não só a necessidade por alimentos, mas gêneros de toda ordem para atender a uma população que, sem perda de tempo, vai descobrindo os prazeres do consumo, cuja perspectiva de expansão é grande. Só para ficar em alguns exemplos, 327 em cada mil chineses possuem telefone celular (contra 423 da média brasileira), e só 27,6 em cada mil têm computador (no Brasil são 74,8). Para dar mais uma idéia da colossal dimensão desse mercado, basta citar que os chineses respondem por 50% do cimento consumido no mundo, 31% do carvão, 30% do minério de ferro, 25% do alumínio, 22% do aço e 7% do petróleo.

Mas quem sonha com as oportunidades que despontam naquele mercado precisa estar preparado e avançar com os pés bem firmes no chão. A China não é para ingênuos e muito menos para amadores. Trata-se de um país cujas importações baseiam-se, prioritariamente, em matérias-primas, em produtos não-acabados. Com uma população calculada em 1,3 bilhão de almas – que pode chegar a 1,5 bilhão – o governo chinês sabe que precisa incentivar e apoiar a indústria local para garantir o maior número possível de empregos. Por isso, em vez de comprar óleo e farelo de soja, como fazem os europeus, prefere obviamente o produto em grão, ocorrendo o mesmo com uma série de outros itens. Para o Brasil, sem dúvida, seria muito mais negócio vender produtos com maior valor agregado, mas o problema é a forte taxação chinesa. Por outro lado, quem quiser vender àquele país deve levar em conta, também, que os chineses, naturalmente, só se interessam por grandes volumes, o que não é desafio simples para quem se dispõe a atender todas as exigências em matéria de qualidade e regularidade de fornecimento.

Ainda há muitos obstáculos a superar para que Brasil e China comecem a interagir, comercialmente, com fluidez. Por enquanto, somos grandes fornecedores de madeira, minério de ferro e soja. Em poucos anos, certamente estaremos vendendo, também, muito algodão. Embora empreendedores brasileiros já tenham incursionado com sucesso por aquele país, prospectando oportunidades, a verdade é que os primeiros passos desse relacionamento comercial somente estão sendo dados agora. Há a dificuldade da comunicação, o quase total desconhecimento da sociedade chinesa em relação ao Brasil e a enorme distância que separa os dois países. Além disso, a imagem do exportador brasileiro foi maculada com o recente imbróglio dos navios carregados de soja contaminada por fungicida, refugados por compradores chineses. Não bastasse, há uma nítida e perigosa situação de inconsistência no relacionamento com alguns setores da comunidade importadora chinesa, que podem, de uma hora para outra, arvorar-se no direito de revisar contratos em vigência, ocasionando prejuízos a quem estruturou-separa vender.

Como já disse antes, a parceria Brasil-China apenas começa a nascer e muitos obstáculos terão que ser removidos para a plenitude do processo. Temos ainda que entender aquele gigante e suas complexidades, cujo PIB chega a US$ 1,3 trilhão (o triplo do Brasil), detendo 5% de participação no comércio mundial (contra 0,9% dos brasileiros) mas com uma renda per capita três vezes menor que a nossa.

O governo fez o seu papel de abrir caminho e estamos começando o namoro. É preciso agora, antes de se tentar avançar precipitadamente em negociações e assinatura de contratos, investir na adequada preparação dos empresários. A China é um mercado com inúmeras oportunidades cujas perspectivas não se esgotam e que será por alguns anos devoradora de recursos naturais e produtos primários, além de concorrente direta do Brasil em produtos acabados, principalmente na área têxtil. Para chegar ao casamento, é preciso vencer etapas e progredir com segurança.

Importante ressaltar também que qualquer abalo na economia chinesa terá graves conseqüências sobre os preços das principais commodities. Embora haja algum indício, oxalá não aconteça por lá o ocorrido no Japão, onde o “boom” imobiliário acabou por arruinar o sistema financeiro; por outro lado, sabe-se ainda que o país detém muitas estatais deficitárias que, ao exaurir grande soma de recursos, estariam impondo dificuldades aos bancos chineses.

Por fim, sobre as sempre comentadas possibilidades para o álcool, há sinalização de receptividade por parte dos chineses em adicionar o produto à gasolina, a exemplo do que pode fazer o Japão. Contudo, a qualidade ambiental das grandes cidades é afetada, em sua maior parte, pelo grande consumo de carvão, fato que, nos parece, coloca em segundo plano, pelo menos por enquanto, a preocupação com as emissões de monóxido de carbono.

*Luiz Lourenço, presidente da Cocamar Cooperativa Agroindustrial, integrou a recente
comitiva de empresários em visita oficial à China, acompanhando o presidente Lula

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