Artigo: Tragédia anunciada
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Eduardo Sciarra* A descoberta de focos de febre aftosa em Mato Grosso do Sul e as suspeitas de novos focos, agora no Paraná, são uma péssima notícia não só para os produtores brasileiros de carne e derivados, mas para a economia do País como um todo. A confirmação dos primeiros casos provocou o embargo imediato de mais de 40 países da comunidade internacional que suspenderam importações. Isso é ruim porque penaliza os produtores, cujos rebanhos estão livres da doença há anos, e põe o Brasil mais uma vez na berlinda. Desta vez, por não priorizar medidas sanitárias efetivas no controle e na fiscalização dos rebanhos brasileiros. Venho alertando para o problema já faz algum tempo. O governo federal não faz investimentos de peso em sanidade animal, principalmente nas regiões de fronteira. Em maio deste ano, integrei a comitiva brasileira na 73ª Sessão Geral do Comitê Internacional da Organização Mundial de Sanidade Animal (OIE). Na oportunidade já se falava dos riscos de o País estar com suas fronteiras desprotegidas. Mas não, o Governo Lula fez ouvidos moucos aos apelos do ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues. Agora, corre atrás do prejuízo. As suspeitas de focos no Paraná, divulgadas na última sexta-feira, desmentem as primeiras declarações do presidente Lula que sustentava até a semana passada que o problema estava localizado na região de Eldorado, em Mato Grosso do Sul, e que demandaria poucos recursos financeiros. A suspeita de aftosa no Paraná, que não registra nenhum caso há 10 anos, é grave e merece uma atenção especial das autoridades competentes. A fiscalização também precisa ser efetiva nos assentamentos, nas reservas indígenas e principalmente na fronteira com o Paraguai. A criação de um conselho interministerial para discutir ações efetivas de combate à febre aftosa, como o proposto pelo governo federal, até ajuda, mas não é o suficiente. Só vai funcionar se houver uma mudança de visão dentro do próprio governo. A falta de empenho do Ministério da Fazenda em liberar recursos fortalecendo a vigilância sanitária é uma das causas para essa crise no setor. A ordem de prioridades está invertida. O Ministério da Agricultura é sempre um dos mais penalizados quando se anuncia cortes orçamentários. Os jornais desta semana trazem dados que confirmam o descaso do governo federal. O orçamento inicial para a erradicação da febre aftosa no Brasil era de R$ 35,3 milhões, mas, com o contingenciamento, esse valor foi reduzido para R$ 20,1 milhões. Deste montante, apenas R$ 13,7 milhões tinham sido gastos até quarta-feira, o que representa 20% do total. Outro dado a se analisar é um estudo do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), órgão da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), da Universidade de São Paulo, mostrando que a defesa sanitária no Brasil tem sobrevivido com o apoio dos investimentos privados. De acordo com o estudo, o setor privado participou, na média, com 74,1% desses gastos de 1992 a 2004. Ainda segundo o estudo do Cepea, foram gastos US$ 224 milhões com defesa sanitária no ano passado. Desse valor, US$ 160 milhões saíram do bolso do setor privado; US$ 40 milhões dos cofres federais e outros US$ 24 milhões dos governos estaduais. Obcecado com o superávit primário, o Ministério da Fazenda se preocupa mais em arrecadar impostos e manter altas as taxas de juros que com as condições sanitárias dos produtos produzidos e consumidos aqui e exportados. Uma visão míope que precisa mudar com urgência, sob pena de comprometer o desenvolvimento da economia. O Brasil tem hoje o maior rebanho comercial do mundo. A bovinocultura, suinocultura e avicultura ainda são alicerces importantes dos negócios brasileiros. Destaco ainda
questões técnicas que envolvem o problema, tiradas durante
o 32.º Congresso Brasileiro de Medicina Veterinária, promovido
pela Sociedade Brasileira de Medicina Veterinária, em Uberlândia,
de 17 a 22 deste mês. O setor pede a implementação,
pelo Governo Lula, de programas oficialmente instituídos para prevenção
e erradicação das enfermidades de acordo com as normas internacionais
adotadas e estabelecidas pelo País. E ainda: reparos na proposta
de reforma do Ministério da Agricultura no que diz respeito à
atuação de profissionais não habilitados em serviços
relativos à sanidade animal; e ampliação do prazo
para a discussão do anteprojeto do governo que regulamenta a Lei
9.712/98, que trata da defesa agropecuária no Brasil. Bravatas como
a do governador do Paraná, Roberto Requião, dizendo que
abdica de recurso na ordem R$ 1,5 milhão autorizado pelo Ministério
da Agricultura por ser uma “ninharia”, não devem ser
levadas em conta nessa hora. Todo e qualquer recurso público federal,
para reforçar a sanidade animal nos estados, é bem vindo.
Só assim sairemos dessa crise, mostrando mais fiscalização,
mais controle e sobretudo mais preocupação e responsabilidade
com a qualidade de nossos rebanhos. *Eduardo Sciarra,
do PFL, é deputado federal do Paraná |