Artigo: Ápice da batalha contra os subsídios do algodão
- Artigos em destaque na home: Nenhum
Campo de algodão aguardando colheita em Mississippi
Por Elizabeth Becker
Washington,
23 de janeiro - Um caso do Tribunal internacional em Genebra poderá
forçar uma solução para a batalha global contra os subsídios
agrícolas, que tem incitado, por décadas, as nações
ricas contra as mais pobres.
O caso vem como uma revolta do Terceiro Mundo contra os $300 bilhões
anuais em subsídios concedidos pelos Estados Unidos, países europeus
e outras nações ricas, o que bloqueou o progresso das negociações
comerciais, regional e global, ao longo do no ano passado.
Desafiando estes subsídios perante a Organização Mundial
do Comércio, o Brasil tem agora o primeiro caso, no qual acusa os Estados
Unidos de quebrarem as regras comerciais concedendo à agricultura e aos
produtores de algodão americanos o subsídio anual de US$ 1.54
bilhões.
Os produtores americanos de algodão - os maiores exportadores do mundo
- dizem que o caso ameaça a sua sobrevivência e todo o sistema
de subsídio agrícola americano. Os brasileiros dizem que a superprodução
causada pelo subsídio americano está destruindo seus mercados
de exportação e enfraquecendo a sobrevivência dos seus agricultores.
Para constrangimento da administração e da indústria de
algodão americana, o Brasil baseou a sua defesa quase que exclusivamente
nos dados do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos e em peritos agrícolas
americanos.
Esta semana, como um sinal de que os Estados Unidos está se cansando
da tática do Brasil, a administração se recusou a fornecer
documentos que poderiam amparar sua própria defesa, alegando que as informações
comprometeriam a identidade de fazendeiros que recebem o subsídio.
Peritos no relativamente novo sistema de disputa e acordos da Organização
Mundial do Comércio disseram que a recusa em fornecer as informações
poderá parecer suspeita para os três membros do painel que está
acompanhando o caso, e amparar as chances de uma decisão contra os Estados
Unidos. Mas como um precedente tão pequeno nesta arena legal global de
oito anos, os peritos estão acompanhando o caso cuidadosamente, ansiosos
sobre os precedentes que ele irá configurar.
"Este é um caso que quebra os padrões - uma área inteiramente
nova - e um caso duro para os Estados Unidos," disse Claude E. Barfield,
Diretor de Estudos de Comércio do Instituto American Enterprise e um
Conselheiro comercial durante a administração de Reagan. "embora
eu seja contra os subsídios agrícolas existente nos Estados Unidos
e na Europa, eu me preocupo com o potencial que temos para um jogo duro e significativo.
Este é um assunto altamente político e volátil."
A decisão do caso é esperada para o início da primavera.
Em audições fechadas, o Brasil afirmou agressivamente que os Estados
Unidos quebrou as regras de comércio, concedendo subsídios ao
algodão para pegar uma fatia maior do mercado de exportação,
forçando a baixa dos preços do algodão mundial, de acordo
com os documentos submetidos por ambos os países.
Ao levar a sua batalha para a sala do tribunal, o Brasil sabia que estava cavando
as estacas. Robert B. Zoellick, representante comercial dos Estados Unidos,
enviou este mês cartas para mais de 100 Ministros do Comercio, dizendo
que ele desejava reativar globalmente as conversações comerciais,
que exigiam progresso nos assuntos de agricultura. Mas as regras, neste caso,
poderão frustrar aquelas conversações.
"É preciso entender que estamos fartos destes subsídios agrícolas,
ouvindo durante 25 anos que as coisas irão melhorar," disse Aluisio
G. de Lima-Campos, um conselheiro econômico na Embaixada Brasileira em
Washington.
"A única maneira tratar o assunto é adotar a proposta de
se fazer ou não fazer isto".
O Brasil, juntamente com a China, Índia, África do Sul e uma dúzia
de outras nações em desenvolvimento, alteraram a balança
comercial global no ano passado, quando se uniram, nas negociações
comerciais de Cancun, México, como uma coligação política
determinada para reduzir os subsídios agrícolas das nações
ricas. Eles argumentaram que os subsídios não só prejudicam
as suas exportações, mas também arruínam a sobrevivência
dos seus agricultores e fazendeiros mais pobres criando, além do econômico,
enormes problemas sociais e políticos.
Os Estados Unidos tem defendido seus subsídios para o algodão,
que o ajudou a se tornar o maior exportador mundial, com mais de 40% do mercado.
Os Oficiais argumentaram que o algodão brasileiro força consistentemente
a baixa do preço do produto dos Estados Unidos nos mercados de exportação
e que mesmo sem os subsídios, os cotonicultores americanos iriam produzir
a mesma quantidade de algodão e os preços mundiais permaneceriam
inalterados.
Os advogados da administração disseram também em suas submissões
que eles estavam mantendo os subsídios nos patamares determinados em
acordos prévios e, assim, estavam protegidos por uma "cláusula
de paz" que proíbe demandas judiciais contra os subsídios
agrícolas na Organização Mundial de Comércio.
"Nosso programa de algodão está de acordo com as nossas obrigações
perante a Organização Mundial do Comércio" disse o
Representante de Comércio, porta-voz Richard Mill. A indústria
de algodão dos Estados Unidos está mais temerosa e descreve o
caso como o "centro da tempestade" que ameaça a sua sobrevivência
e todo o sistema de subsídios agrícolas americano.
"Se este painel decidir contra os Estados Unidos pode forçar revisões
radicais nos programas de "commodities" dos Estados Unidos,"
disse William A. Gillon, Conselheiro Legal do Conselho Nacional do Algodão,
um grupo de comércio. A Administração e o Sr. Gillon foram
especialmente críticos com referência ao trabalho de Daniel A.
Sumner, professor de Economia Agrícola na Universidade de Davis, na Califórnia,
e antigo Secretário Assistente de Economia no Departamento de Agricultura
durante a primeira administração de Bush.
Contratado como consultor pelo Brasil, o Sr. Sumner criou um modelo econômico
mostrando que os subsídios americanos levaram os produtores dos Estados
Unidos a plantar mais algodão, provocando aumento das exportações
e forçando a queda dos preços mundiais do produto. Em uma apresentação
especial para o painel da Organização Mundial de Comércio,
ele escreveu que se os fazendeiros não tivessem recebido os subsídios,
as exportações americanas teriam diminuído em média
41.2% e o preço mundial de algodão teria aumentado em 12.6%.
Os Estados Unidos contrariam a sua própria argumentação
que criticou a análise do Sr. Sumner, dizendo que a mesma era falha e
errada, considerando o fator de altas e baixas normais do mercado mundial.
Vários membros da indústria de algodão tiveram um encontro
com o Sr. Sumner e lhe disseram a ele que ele era um desertor renegado.
"Uma pessoa me falou que se isto fosse uma questão militar, eu seria
um traidor" comentou o Sr. Sumner, que disse ter permanecido em seu trabalho.
"Eu não entrei nesta tarefa por nenhum outro motivo que não
seja a melhor evidência possível da razão neste processo
de disputa", disse ele. "Eu sou um partidário muito forte de
esforços multilaterais, e quero o processo de disputa na Organização
Mundial de Comércio seja o mais justa possível."
(Publicado em 24 de janeiro de 2004 - Jornal "The Times")
Tradução: Erlita Ricas, da AMPA