OBSERVAÇÕES DE FAYET SOBRE O RISCO BRASIL
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Há mais de 40 anos trabalhando e fazendo avaliações de riscos, ora para empresas ou projetos específicos, ora para cenários macroeconômicos, o economista Luiz Antônio Fayet, foi convidado pelo Sistema Ocepar para falar aos dirigentes de cooperativas que participaram das reuniões de Núcleos Norte/Nordeste, em Ubiratã, Centro Sul em Ponta Grossa, Oeste em Medianeira, Sudoeste em Pato Branco nesta semana. O tema escolhido para sua palestra foi: ?análise das perspectivas da economia paranaense com ênfase ao agronegócio?. Durante 40 anos de vida profissional, Fayet exerceu diversas funções, desde professor universitário, técnico do Banco de Desenvolvimento do Paraná - BADEP, do qual foi presidente durante 5 anos, foi deputado federal, diretor e presidente do Banco do Brasil, além de empresário e consultor. A seguir publicamos um resumo desta sua palestra, proferida durante esta semana para mais de 400 dirigentes cooperativistas.
Risco econômico da ?empresa Brasil? ? Este é um apanhado sintético e com valores aproximados das contas nacionais, que se parecem com as contas de uma empresa, focando os últimos sete anos. O endividamento externo privado saltou de 61 bilhões de dólares em 1994 para 119 bilhões de dólares em 2.001, passando a representar perto de 25% do PIB. A dívida total do setor público evoluiu de R$ 153 bilhões em 94 (30 % do PIB) para R$ 660 bilhões em 2001 (54 % do PIB), parte dela vem sendo dolarizada e continua crescendo. A soma dos juros pagos na dívida pública total alcança a grandezas da ordem de 700 bilhões de reais nos sete anos, ou seja, mais da metade do PIB atual ou ainda, 16 usinas de Itaipu. Quando comparamos as receitas e despesas do governo federal constatamos que ele vem obtendo superávites, entretanto, nesta conta não estão incluídos os juros da dívida interna, os quais representaram mais de duas vezes o superávit. Por isso, a dívida contínua crescendo. A carga tributária passou de 23% para 34%, crescendo perto de 40% e atingindo níveis que desafiam a capacidade contributiva de uma população que é muito pobre. Perversamente, este fato determinou que a sonegação fiscal tornou-se uma defesa generalizada dos agentes econômicos.
PIB - A evolução do PIB por habitante foi de 5,5%, menos de 1% ao ano, muito baixa tendo em vista as necessidades da sociedade, mas se crescer mais rápido demandará mais infra-estrutura, que hoje já está comprometida por deficiências. As contas externas nos últimos 3 anos têm apresentado rombos superiores a 50 bilhões de dólares/ano, requerendo empréstimos e investimentos estrangeiros para se equilibrarem. Tais procedimentos vão determinando uma crescente vulnerabilização e dependências internacionais. Diga-se, alienação da soberania. A política cambial durante todo o período manteve o dólar artificialmente barato, beneficiando as importações e dificultando as exportações de bens e serviços. Poderíamos configurar que o governo subsidiou os que venderam ao Brasil e criou uma espécie de imposto para seus exportadores. Adicionalmente, a crise da Argentina prejudica as exportações e poderá significar em 2.002, uma redução de 3 bilhões de dólares, ou mais.
Prejuízo - Somando-se o que o Brasil deixou de ganhar no comércio externo, em média 12,4 bilhões de dólares/ano e o que passou a perder, em média 3,3 bilhões de dólares/ano, em sete anos deu de graça para produtores e empregados de outros lugares do mundo, um mercado de mais de 110 bilhões de dólares, mais de 20% do PIB. O pior está em que os países ricos defendem o livre comércio, mas a cada dia criam mais barreiras nos seus mercados, com sobretaxas (ex. aço, sucos, café) e, especialmente subsídios para os produtos rurais, avaliados em US$ 370 bilhões em 2.001. Para manter o equilíbrio anterior, o dólar deveria estar cotado próximo de R$ 3,00. A inflação medida pelo IPA e pelo IGP, ultrapassa 100%, enquanto o IPCA que é a medida oficial, fica em 78%, caracterizando a existência de inflação represada. Havendo ajuste no câmbio e crescimento econômico, automaticamente a inflação deverá aumentar levemente, entretanto, sem comprometer o importante equilíbrio relativo conquistado. No período os juros primários variaram entre 60% e 17,5% a. a. , comprometendo o custo das dívidas internas e a competitividade da produção.
Analisando todos esses dados oficiais, conclui-se que a situação da ?empresa Brasil? é bastante delicada e não tem recuperação no curto prazo.
Ambiente institucional - Fazendo uma análise retrospectiva para 10 ou 20 anos, constata-se que o País teve uma grande evolução institucional. A Constituição de 1988 e outras novas leis aprovadas criaram um quadro de direitos e relações muito mais bem definidos e, principalmente, procuraram premiar a responsabilidade na gestão pública e punir os desvios. Entretanto, usando uma expressão bem brasileira, ?a lei ainda não pegou?, conseqüentemente, os investidores e mesmo as pessoas, não se sentem seguras quanto à aplicação das normas legais. Alguns fatos são flagrantes, como a demora das decisões judiciais, o mau funcionamento dos PROCONs, a confusão de normas regulatórias das ?agências de controle de concessões?, etc. Basta ler o noticiário da imprensa para sentir os desencontros. Essas questões são muito relevantes, pois geram um clima de incertezas e descontrole para os agentes econômicos, que só se aventuram a investir em condições especulativas, ou seja, ?ganhar antes de aplicar o seu?. Queiramos ou não, o Brasil não se enquadra no conceito de ?institucionalizado? e por isso tem um risco elevado, tanto para investidores de dentro como para os de fora. À medida que as ?leis forem pegando? o conceito mudará, de qualquer forma, já melhorou muito, já é um outro país.
Ambiente político administrativo - As características do ambiente institucional transbordam para esse campo, há uma grande sensação/constatação na sociedade de que a gestão pública é corrupta e ineficiente e que a impunidade premia os abusos e os criminosos. Logo, os investidores não podem descartar as hipóteses de chantagem e extorsão contra seus negócios. A criação do estatuto da reeleição para cargos do executivo e o uso despudorado e impune das máquinas públicas nas eleições, representam um grande retrocesso para o País. São exemplos os casos da contenção forçada do preço do dólar pelo Banco Central e, no Paraná, a redução em 50% nos preços dos pedágios, tudo isso ocorrido no ano eleitoral de 1998. Passadas as eleições veio a verdade. Hoje, em especial, os ultra-sensíveis mercados financeiros, refletem esta síndrome. O Congresso Nacional que é e continuará sendo conservador, comporta-se e compõe-se dentro das determinações do poder executivo, que tem um forte poder de persuasão não ideológico. Os partidos políticos de modo geral, não têm base ideológica, são regidos por conveniências regionais e a legislação específica não favorece melhorias no quadro, mas o sentimento democrático consolidou-se e as diversas correntes de opinião desejam essa consolidação. Hoje os mais bem posicionados candidatos à Presidência fazem o mesmo discurso, prometendo mudanças na falida política econômica, análoga à da Argentina. Inclusive o candidato governista tenta passar mensagens de mudança. Ganhe quem ganhar a eleição, terá de estruturar uma base de apoio parlamentar que será fatalmente conservadora, determinando um baixíssimo risco de radicalismos e, dada a situação econômica e social, se obrigará a ?construir um pacto político? para a reconstrução nacional.
Conclusões ? Embora o grande grau de simplificação apresentado pode-se afirmar que o Brasil apresenta um elevado risco para operações de curto e médio prazo, pois os fundamentos da economia estão muito fragilizados e, não se sabe exatamente como agirá um próximo governo para ?iniciar? o longo processo de reversão. Entretanto, como os principais candidatos condenam a política econômica, espera-se que a produção e o emprego passem a ter prioridade. Os aspectos institucionais e político-administrativos deverão continuar melhorando, mas não recomendam que os investidores, exponham-se. Reservas de liquidez e segurança cambial são fundamentais. Os riscos tipo MST, violência urbana, etc., são frutos da incompetência e da falta de vontade política em resolver as raízes dos problemas. É possível mudar e existem os meios, principalmente através da austeridade no cumprimento das leis e do crescimento econômico. O Brasil detém os maiores estoques de terras agricultáveis e maior reserva de energia renovável do mundo, uma das maiores disponibilidades de água potável e recursos minerais, um povo bom, criativo e construtivo. Foi um dos países que mais cresceu nos últimos 50 anos e é hoje a fronteira mais promissora do desenvolvimento mundial, independentemente de quem ganhe a presidência. Para quem deseja estabelecer-se com visão de longo prazo é provavelmente a melhor opção no planeta, mas necessitará paciência e preparo para a luta. As linhas do cenário atual são antigas. Os analistas de risco estão certos, o Brasil foi colocado numa situação de alta vulnerabilidade, mas no momento, eles também estão ajudando as especulações e, a mídia, de modo geral, fala o que interessa aos seus patrocinadores, ampliando a confusão. O poder de recuperação de nossa economia é tão grande, que movendo câmbio e juros ela poderá gerar o início de uma sólida e revolucionária recuperação, trazendo significativas melhorias nos índices sociais. A realidade do presente é triste, mas o futuro é muito promissor, espero chegar vivo até lá.