AGRICULTURA: Safra boa não é suficiente para pagar dívidas no campo
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A excessiva divulgação dos bons resultados da safra 2006/2007 está reduzindo a importância do endividamento dos agricultores em conseqüência de quatro safras ruins nos últimos dois anos, ou seja, safra de inverno de 2004, safras de verão e inverno em 2005 e safra de verão de 2006. Para alguns dirigentes de cooperativas paranaenses, os resultados da última safra e das perspectivas para este ano, apesar de toda a bonança propalada, ainda trazem grandes preocupações, especialmente o milho safrinha. O endividamento do setor será um dos assuntos a ser abordado nesta quarta-feira (18/04), pelo presidente do Sistema Ocepar, João Paulo Koslovski e demais membros da diretoria da entidade, durante audiência com o ministro Reinhold Stephanes, da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), em Brasília. A reunião está marcada para acontecer às 15 horas. Além de manifestar suas preocupações sobre o tema endividamento, os dirigentes cooperativistas irão apresentar propostas para outros temas como a criação de um programa de garantia de renda mínima para o setor, liberação de recursos para defesa agropecuária, seguro rural, juros compatíveis, investimentos para o setor, entre outros.
Passivo - Estudo realizado pela Agroconsult mostra que a agricultura brasileira tem um passivo, neste ano, de R$ 20,3 bilhões, resultado do balanço negativo da frustração dos últimos dois anos e de renegociações anteriores (Securitização, Recoop, Pesa etc). Embora a empresa estime que o Paraná fechará este ano com salto positivo na agricultura após pagar os compromissos, três Estados fecharão no vermelho: Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Goiás. Em média, as dívidas de 2007 representam 18,4% do faturamento, não do lucro líquido. No Paraná, as dívidas somam R$ 2,5 bilhões para um lucro estimado de R$ 4,9 bilhões. Esses números dão credibilidade às afirmações dos dirigentes de cooperativas do Paraná, segundo as quais há mais discursos do que fatos positivos.
Surpresas - Embora considere animadora a safra deste ano comparada com os últimos dois anos, “a expectativa não vem se concretizando em termos de produtividade ou de preços”, afirma Almir Montecelli, presidente da Cooperativa Central de Algodão (Coceal). “Estamos tendo surpresas bastante desagradáveis, na soja principalmente, com variação muito grande na produtividade por causa da época de plantio e incidência de doenças”, afirma. O preço em dólar é bom, mas “com a variação do real vemos a possibilidade do lucro maior do produtor ir embora”, frisa Montecelli. Cita ainda a alta dos insumos com causa da elevação dos custos de produção. “Precisamos de mais algumas safras boas para equilibrar as contas”, finaliza.
Prudência - Para o presidente da Copagra (Nova Londrina), Miguel Tranin, após sucessivas crises os agricultores têm tomado mais prudência, investido em tecnologias e conduzido as lavouras de forma mais eficaz para obter mais produtividade. “Esse resultado tem se transferido ao produtor e à região”. Visando garantir renda ao produtor a Copagra incentiva a produção de cana-de-açúcar, mandioca arroz, sem esquecer o uso de tecnologias. E foi no arroz que os produtores tiveram uma agradável surpresa com uma produtividade próxima a 200 sacas por hectare num ano de preço bom. A safra boa deste ano pode ter um desfecho ruim para os produtores de milho safrinha, especialmente do Oeste do Paraná. Edivino Schadeck, presidente da Fecoerpa (Federação das Cooperativas de Eletrificação Rural), afirma que “se não chover nos próximos dias, no Oeste vai ter uma grande quebra no milho safrinha; e se as geadas não esperarem um pouco”.
Reflexos da aftosa - Enquanto os cereais e fibras dependem do clima e dos preços do mercado internacional, as carnes sofrem também da síndrome da aftosa que afetou pesadamente o mercado brasileiro. Valter Vanzella, presidente da Frimesa, cooperativa central com sede em Medianeira que atua no abate e industrialização de suínos e no processamento de leite, pintou um quadro preocupante para o setor, cujos reflexos da aftosa ainda são sentidos 18 meses depois do surgimento do foco de aftosa no Mato Grosso do Sul. Além dos problemas de estiagem e valorização do real, “tivemos a aftosa, com impacto econômico fantástico, que persiste até hoje”, cita. “Temos uma situação muito complicada na área de suínos com a Rússia, que parou de importar, e com outros países que baixaram os preços, a tal ponto que na sexta-feira (30/03) o preço do suíno vivo estava entre R$ 1,10 a R$ 1,20 por quilo, quando o custo está na faixa de R$ 1,80”, explicou Vanzella. A situação só não é pior por causa do mix de produtos industrializados pela cooperativa. “Eu faria um balanço de 2006 como um ano a ser esquecido”, resume.
Discurso - Embora reconheça que o ano começou com certo otimismo, Vanzella afirma que tem ouvido “mais discursos de recuperação do que fatos que estão resolvendo os problemas. Houve queda no custo da safra implantada, os preços deram uma melhoradinha, mas o ganho final não é suficiente para recuperar o que perdemos no passado. Está melhorando, mas não é proporcional ao entusiasmo que está sendo vendido pela grande mídia, de solução para todos os problemas”. Enquanto as conseqüências da febre aftosa ainda persistirem e se não houver uma abertura dos mercados, os excedentes de produção de carne e leite contribuem para manter um nível de preço ruim que inviabiliza o produtor.
Parque industrial - A crise sem precedentes da agropecuária nos últimos dois anos, apesar de atrasar o desenvolvimento do setor, “não comprometeu a saúde financeira nem a tesouraria das cooperativas, o que é altamente positivo”, afirma o presidente da cooperativa Bom Jesus, da Lapa, Luiz Roberto Baggio. Para ele, “é importante avaliar que o parque industrial das cooperativas e os investimentos em agroindústrias contribuíram para fortalecer a cooperativa como um pilar sólido de negócios”, reduzindo os efeitos da crise. Também o bom relacionamento entre a diretoria e o quadro social, que é cliente e fornecedor das cooperativas, contribuiu para amenizar os efeitos da crise e manter a regularidade do desenvolvimento.
Responsabilidade - Também Dilvo Grolli, presidente da Coopavel, os anos de extremas dificuldades serviram para demonstrar a grande responsabilidade que as cooperativas têm, como empresa, precisa mostrar resultados, e com o produtor rural que entrou em dificuldade. “Mas no balanço geral foi positivo, pois mostrou que as cooperativas têm estrutura profissional e econômica para superar essa crise. As cooperativas foram a sustentação do agronegócio dentro do Estado, provando que têm um grau de sustentação da parte econômica e social. Os filiados às cooperativas tiveram a mão de suas cooperativas para dar sustentação às suas atividades”, concluiu.
Agenda – Koslovski cumpre uma extensa agenda em Brasília. O presidente da Ocepar já esteve reunido com José Gerardo Fontelles, assessor do Ministério da Fazenda, além de reuniões no Banco do Brasil e na Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Ele também participou da posse do deputado federal Moacir Micheletto (PMDB/PR) como presidente do Grupo Parlamentar Brasil/Croácia no Congresso Nacional.