SECOAGRO: José Hamilton fala sobre as lições de um repórter de campo

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Sem dúvida, José Hamilton Ribeiro é um repórter de campo. Entrou no campo profissional em 1952, aos 20 anos de idade, e jogou em todas as posições: rádio, jornal, revista, livro, televisão. Mas não embola o meio-de-campo: para o veterano jornalista, os veículos podem variar, mas a bola - a informação - é a mesma. José Hamilton também foi para o campo de batalha. Em março de 1968, na cobertura da Guerra do Vietnã para a revista "Realidade", pisou - não na bola, mas numa traiçoeira mina terrestre. Perdeu uma perna, mas levantou e seguiu adiante. Um dia perguntaram a ele se era difícil ser jornalista com uma perna só. A resposta: "Com uma perna só é difícil, mas com quatro é pior". A dura experiência no Vietnã está registrada em forma de diário no livro "O gosto da guerra" (1969).

Palestra - Nesta sexta-feira (03/04), José Hamilton estará em Londrina para um evento do campo - a Expo Londrina 2009. O grande repórter vem a convite da Embrapa, Associação de Jornalistas do Agronegócio do Paraná (AJAP) e Sociedade Rural do Paraná. A partir das 9 da manhã, ele faz a palestra "Segredos da profissão: experiências de um jornalista de campo". O evento faz parte do Secoagro (Seminários Itinerantes sobre Comunicação e Agronegócio) promovido com o apoio da Ocepar, Faep, Sindijor-PR e Sindicato dos Jornalistas de Londrina.

Prêmios - No campo dos prêmios, José Hamilton tem uma considerável experiência. A galeria de troféus jornalísticos do homem inclui sete prêmios Esso, dois prêmios J. Reis (de jornalismo científico), Prêmio Embratel, Prêmio Caixa/Revista Imprensa, Prêmio Vladimir Herzog, Prêmio Imprensa da ONU e - um dos mais tradicionais do mundo - Prêmio Cabot, conferido pela Universidade Columbia (EUA). Como forma homenagem - e numa referência às coisas do campo - virou até nome de flor: Anthurium hamiltoni.

Globo Rural - Desde 1982, é repórter especial do Globo Rural. Nas manhãs de domingo, pode ser visto percorrendo fazendas, plantações, cidades e centros de pesquisa do Brasil inteiro. Sempre em busca da planta fundamental - a informação - José Hamilton Ribeiro diz que o maior prêmio é sempre aquele que ainda está por vir. "Isso mostra que ainda estamos na luta." Pensando bem, esse é o principal campo de Zé Hamilton. A luta.

Serviço: Palestra de José Hamilton Ribeiro: sexta-feira (3/04), às 9 horas, no Recinto Horário Sabino Coimbra (Parque Ney Braga). Mais informações no site www.secoagro.com.br.

 

"Reportagem investigativa é a única saída para o jornalismo"

 

JL: Qual foi o seu prêmio mais importante?

José Hamilton Ribeiro: O prêmio mais importante para o jornalista é aquele atribuído por colegas. É um reconhecimento dos profissionais. É o caso do Prêmio Esso. No meu tempo de jornalismo impresso, era um prêmio valorizado. Ganhei sete. Mas também houve um prêmio internacional inesperado, o Prêmio Cabot, da Universidade Columbia (EUA). No ano passado, ganhei o Prêmio de Imprensa da ONU. Mas o prêmio mais importante é aquele que você ainda espera ganhar. Quer dizer que você ainda está na luta, está fazendo coisas de qualidade.

 

Há algum trabalho seu que mereceria um prêmio e não o recebeu?

O caso óbvio é a cobertura da Guerra do Vietnã, que seria um candidato natural ao Prêmio Esso. Porém, naquela época, o regulamento do prêmio não permitia a participação de reportagens feitas fora do Brasil. Nos outros casos, alguns você ganha, outros não, a vida é assim.

 

Quais foram os seus mestres no jornalismo?

Quando entrei na imprensa como jornalista profissional, aos 20 anos, meus mestres eram os repórteres que estavam aqui em São Paulo na época. Minha tribo era de São Paulo. Cada geração de jornalistas observa o trabalho de certos profissionais. Isso varia de tempos em tempos. Se você considerar uma geração a cada 20 ou 25 anos, no meu caso havia uma geração no começo; outra no meio do caminho; e uma terceira agora. São profissionais diferentes. Há essa renovação natural. Tive sorte de trabalhar com grandes jornalistas: Mino Carta, Raimundo Pereira, Sérgio de Souza (que morreu recentemente), o pessoal aqui da TV Globo (grandes jornalistas que não aparecem muito porque são gente de coordenação). Minha vantagem foi essa: sempre trabalhei com gente muito boa e pude me apoiar nessas pessoas para fazer alguns trabalhos reconhecidos.

 

O sr. publicou vários livros. Qual deles é o mais importante?

"O gosto da guerra" talvez seja meu livro mais citado, quase obrigatório. Assim que voltei, um editor da Brasiliense, que na época era uma editora muito forte, me procurou e disse: "Você precisa parar de trabalhar por um ou dois meses e publicar essas memórias do Vietnã em livro. Acabei ouvindo essas ponderações e publicando o livro em forma de diário. É o dia-a-dia da guerra."O gosto de guerra" e "Com a FEB na Itália", de Rubem Braga, são dois livros muito importantes de cobertura de guerra em língua portuguesa. Eu gosto demais do Rubem Braga. É uma coisa fantástica ele fazer reportagem de guerra, com aquela falta de jeito para mexer com militares, equipamentos, armas. Ele fez uma cobertura de guerra voltada para o ser humano, para o cotidiano. A gente sempre procura olhar os bons e fazer parecido.

 

A revista Realidade vai voltar em forma de livro?

Uma editora aqui de São Paulo procurou a mim e ao repórter José Carlos Marão, que foi um dos repórteres da Realidade, na fase de ouro da revista, para fazer um livro, que já tem até título: "Realidade Re-vista - As melhores reportagens da revista que marcou época no jornalismo". Não só reportagens nossas; há também textos de Luis Fernando Mercadante, um príncipe, um repórter machadiano maravilhoso; de Paulo Patarra, que era redator-chefe e também fazia reportagens; de Sérgio de Souza - e outros que vamos selecionar. É um livro que vai contar o fenômeno Realidade e tentará explicar por que se deu esse fenômeno e quais foram as peças jornalísticas que fizeram esse marco do jornalismo no Brasil.

 

A Realidade deixou frutos?

A experiência da Realidade, no âmbito de revistas, tem uma importância relativa à que tiveram os jornais diários do Rio de Janeiro - especialmente o Diário Carioca e o JB - na década de 50, principalmente por jornalistas nordestinos e gaúchos. Logo depois da guerra, alguns jornais cariocas fizeram uma importante reforma gráfica e léxica; houve uma mudança na forma de escrever jornal no Brasil. A Realidade teve uma importância grande para a reportagem investigativa - que, na minha opinião, é a única saída para o jornalismo de papel. O resto, a internet faz.

 

Quais são as principais diferenças entre o jornalismo de TV e o jornalismo impresso?

Do ponto de vista do conteúdo, o jornalismo de papel (jornal ou revista) e o jornalismo eletrônico (TV, rádio e internet) se equivalem. Do ponto de vista da forma, cada veículo tem os seus macetes, seus segredos, suas regras. Mas o jornalista que vai da TV para o jornal pega tudo isso rapidamente; e, inversamente, o bom jornalista do papel descobre rapidamente as manhas da televisão e passa a fazer bom jornalismo eletrônico. A diferença maior entre o jornalismo de TV e o de papel é que na TV é mais difícil enganar. Tem o exemplo daquele rapaz, repórter do New York Times - imagine, do New York Times - que inventava entrevistas e personagens. Agora, se você põe escrito que entrevistou o sr. João da Silva em Paranavaí, o camarada pensa que existe um João da Silva em Paranavaí. Na TV, quando você coloca a entrevista do João da Silva de Paranavaí, ele está com a cara ali na televisão. Se não for, ele mesmo diz: "Não sou de Paranavaí; sou da Penha". Na TV, também se engana, mas o sujeito é pego mais rápido. O sujeito que inventasse personagens para a TV seria desmascarado em um mês ou uma semana. No jornal de papel, demorou um ano para descobrir que o repórter falsificava as matérias. E no New York Times. O sujeito chegou até a ganhar prêmio.

 

O sr. já escreveu ficção?

Tenho 14 livros. Todos são frutos de reportagens. Em um deles, "Pantanal: Amor-Baguá", dirigido ao público infanto-juvenil, tem uma parte de ficção: um caso de amor entre dois jovens (um menino e uma menina). O cenário do Pantanal é verdadeiro. Os personagens é que são criados para não constranger ninguém.

 

Foi difícil escrever "Jornalistas 37/97", que conta a história do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo? Um livro daquele porte demanda muita pesquisa, muita entrevista, muito tempo de organização. Tive ajuda de muitas pessoas. Toda vez em que se escreve a história da imprensa de uma capital, de um estado ou de um país, está sempre vivendo a empresa - fazendo a história da empresa, do jornal, da revista. A proposta do livro era fazer a história da imprensa pela visão dos jornalistas. Nesse livro, há uma entrevista muito boa com Audálio Dantas (ex-presidente do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo) sobre o caso Vladimir Herzog, em 1975. Realmente, é uma parte importante do livro. Nós choramos juntos naquela entrevista. (Jornal de Londrina)

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