COPENHAGUE: Negociação climática tem futuro incerto

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A falta de consenso na Conferência do Clima de Copenhague estabeleceu uma grande confusão no futuro do regime climático internacional. O fracasso do evento ameaça o processo da ONU, analisam os mais críticos. Mas este fórum complicado, onde cada um dos 193 países pode bloquear decisões que só podem ser tomadas por consenso, ainda é a única arena democrática que o mundo tem para tomar decisões planetárias, lembram outros. O que alguns esperam, como o ministro do Meio Ambiente Carlos Minc, é que as decisões tomadas sejam implementadas pelos países e indústrias à revelia do acordo que não ocorreu.

Valor - O documento "informativo" que saiu da CoP-15 não terá sequer o logo da UNFCCC, a Convenção do Clima da ONU. É quase uma nota de rodapé. A ONU apenas "tomou nota" dele. Se os países o tivessem adotado, seria um acordo da ONU. Mas, como não houve consenso, não ficou claro que valor ele tem. "É como se algo tivesse dado muito errado no meio do caminho, e quem teve a ideia deste acordo deve estar pensando: 'que monstro criamos?'", diz Mark Luttes, da ONG WWF internacional. O acordo, costurado basicamente pelos países do G-20 e rejeitado por Venezuela, Bolívia, Cuba, Sudão e Tuvalu, é um estranho no ninho nos trâmites da ONU. "A situação agora é tão confusa que nem os diplomatas têm o mesmo entendimento de como prosseguir."

Acordo de intenções - O Acordo de Copenhague não é tratado, nem protocolo, nem uma decisão da CoP. Não tem valor legal. Tem a força de um acordo de intenções que nem todas as partes assinaram. "Em 2007, em Báli, todos concordaram em ter um acordo em Copenhague", diz Mike Shanahan, porta-voz do International Institute for Environment and Development, centro de pesquisa de Londres. "Agora, em Copenhague, nem todos concordaram em não ter nenhum acordo."

Início essencial - Para o secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, o acordo sem decisão "é um início essencial". Para os ambientalistas, "um fracasso histórico". Para outros observadores, um processo sem volta - as energias renováveis estão em foco, os países têm modificado sua matriz energética à revelia de acordos, as empresas estão no jogo. "Segunda-feira [hoje] já estaremos implementando nosso plano", disse Minc. Mas a indefinição do marco legal confunde o cenário e o rumo dos investimentos.

Modificações - O conteúdo do acordo foi modificado cinco ou seis vezes na sexta-feira (18/12) e na madrugada de sábado (19/12). A penúltima versão reconhecia a necessidade de um esforço de longo prazo para manter o aumento da temperatura em 2ºC no fim do século, reduzir as emissões globais em 50% até 2050 e ter financiamento de curto prazo de US$ 30 bilhões entre 2010 e 2012. Também se concordava com um fundo de US$ 100 bilhões por ano, em 2020, mas sem dizer de onde viria o dinheiro e nem quem o administraria. Tudo estava desamarrado e, mesmo assim, ficou sem consenso. Sua implementação deveria ser engatilhada em 2016, dizia o texto.

Aceitação - Os países da Aliança Bolivariana logo avisaram no plenário que não aceitariam o acordo. Venezuela, Cuba e Bolívia se sucederam em apartes de desaprovação e revolta. Tuvalu também avisou que não o aceitaria. "A negociação do acordo na sexta-feira foi como estar num balão de ar pesado demais, e começar a jogar coisas lá de cima para aliviar a pressão, até que não sobra nada", avaliava um especialista em negociações internacionais.

México - No final de 2010, haverá a CoP-16, no México. É uma decisão da Convenção do Clima, de 1992, ter reuniões anuais, e o fracasso de Copenhague não afeta isso. Também devem ocorrer encontros dos órgãos técnicos da Convenção, que se reúnem regularmente. Na longa madrugada de sábado, diplomatas argumentavam que o acordo climático é um processo com avanços e retrocessos. "É muito difícil manter o Protocolo de Kyoto, elevar as metas e colocar os EUA no jogo", admitia um negociador do G-77, o grupo dos países em desenvolvimento. "Mas em Báli tínhamos, pelo menos, um mapa do caminho, um caminho até Copenhague", lembra Shanahan, do IIED. "Mas e agora?" . (Valor Econômico)

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