Entrevista com Mendonça de Barros: Tendências do agronegócio no Brasil e no mundo
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Durante sua passagem por Curitiba, na última sexta-feira (23), quando participou do Fórum Financeiro promovido pela Ocepar e pelo Sescoop Paraná, o economista e consultor de mercado José Roberto Mendonça de Barros, concedeu uma entrevista exclusiva para o "Paraná Cooperativo", na ocasião ele fez uma análise do desenvolvimento do agronegócio no Brasil e no mundo. A palestra proferida pelo consultor para uma platéia de aproximadamente 100 representantes de cooperativas e profissionais de instituições financeiras, está a disposição no site da Ocepar.
Paraná Cooperativo - Que cenário o senhor projeta para o setor do agronegócio neste ano de 2004?
Mendonça de Barros - Vejo um cenário bastante positivo. Apesar de que o setor sofreu algumas perturbações climáticas nos últimos anos, especialmente aqui no Paraná, onde a produção da safra de verão foi um pouco afetada em virtude de estiagem em algumas regiões. No conjunto, como os preços estão muito bons o resultado é positivo. A renda irá subir, o volume exportado cresceu e os resultados são excelentes e prenunciamos uma comercialização que deverá ser tranqüila, pois os preços internacionais estão favoráveis e no mercado doméstico também. No caso do Paraná se anuncia um bom plantio de inverno, especialmente o trigo. Safrinha está em curso e as chuvas melhoraram. No conjunto teremos um ano extremamente positivo para o agronegócio, embora o setor já venha sofrendo com os efeitos da falta de investimento em infra-estrutura, o que significa aumento no custo de produção, fretes mais caros, fila de espera no Porto, deságio na exportação que é um desafio para o Brasil como um todo e ao Paraná também e que tem que ser enfrentado com decisão nos próximos anos.
Paraná Cooperativo - Com relação ao câmbio, como ele irá se comportar neste período?
Mendonça de Barros - Imaginamos que o real irá se desvalorizar lentamente no decorrer deste ano frente ao dólar. Poderemos chegar ao final deste ano em algo em torno de R$ 3,15 por dólar, a média diária R$ 3,00. Por que esta desvalorização? É que o dólar lá fora deverá se valorizar nos próximos meses frente à moeda européia (euro) e a joponesa (iene), isso levaria a uma certa desvalorização da nossa moeda. Isto não aponta para uma grande oscilação ou volatilidade, o que é muito bom para o setor que é essencialmente exportador, então, isto é um fator que irá colaborar para um bom cenário em 2004.
Paraná Cooperativo - Além desses entraves internacionais que o senhor mencionou anteriormente, o aumento dos juros americanos também poderá interferir de alguma forma em nossas exportações?
Mendonça de Barros - Olha, esta perspectiva de aumento da taxa de juros norte-americano vai implicar em alguma redução de preços de commodities, é normal que isto seja o resultado da valorização do dólar e da alta da taxa de juros. Não vejo por outro lado nenhum outro problema mais grave, porque as condições fundamentais de oferta e demanda no mundo desenvolvido, quer seja demanda da China são bastante favoráveis. Poderemos ter uma redução de alguma cotação muito alta de alguns commodities, sem que seja nada problemático. Acho que as quantidades exportadas continuarão se elevando e pode mais ou menos compensar uma pela outra, razão pela qual esperamos um saldo da balança comercial muito positiva para este ano, na ordem de US$ 26 ou US$ 27 bilhões.
Paraná Cooperativo - Até quando o agronegócio continuará sendo fator decisivo no equilíbrio da Balança Comercial brasileira?
Mendonça de Barros - Com certeza o agronegócio continuará sendo o puxador das exportações brasileiras, pela simples razão de que o País continuará sendo o mais competitivo do mundo em termos de agronegócio, não tem restrição de terra, de máquinas, pode aumentar a produção se a demanda assim exigir. Um fato relevante, especialmente para o Estado do Paraná são as condições sanitárias vividas por produtores de outros continentes, que sofrem com o mal da vaca-louca ou com a gripe aviária e que acaba trazendo resultados positivos para exportações de carne brasileira. A capacidade de resposta do sistema produtivo brasileiro, inclusive do Paraná é enorme e poderá progredir. Por um outro lado, para a indústria, a lerdeza do mercado interno tem sido um pé-no-freio. Mesmo assim, o agronegócio continuará em 2004 puxando o cordão do crescimento no Brasil.
Paraná Cooperativo - Por que as cooperativas devem exportar?
Mendonça de Barros - Exportar é vital por diversas razões. Primeiro que ela permite superar as eventuais dificuldades do mercado interno, portanto, permite aumentar escala, um exemplo é a produção de frango. Segundo, a exportação de grãos na entrada da safra, no caso do milho ou do trigo no ano passado ajuda dar piso para os preços e renda para os cooperados. É bom lembrarmos quem foi pioneiro na exportação de milho, mesmo no período de safra, foram as cooperativas. Terceiro é que trabalhar no mercado internacional permite tomar dinheiro lá fora sem ter receio de ficar com descasamento de moedas, pois como exportação rende dólares, parte do seu financiamento pode ser na moeda americana. Quarto e mais importante de todos é que o contato com o mercado internacional abre cabeças, estimula inovação, faz perceber mais rapidamente as mudanças, deixa as pessoas mais espertas, preparadas para a competição. A cooperativa que entra no mercado exportador ela começa mudar sua natureza para melhor, ela vira uma entidade muito mais competente e mais apta para atuar num mundo cheio de surpresas.
Paraná Cooperativo - O senhor abordou a questão da logística e infra-estrutura. Qual a sua avaliação sobre investimentos para o setor?
Mendonça de Barros - Infelizmente não vejo no horizonte indicadores de que serão investidos recursos necessários para esta questão. Precisamos ver como é que será dado encaminhamento das parcerias Público/Privado que está um tanto nebulosa, digamos assim. Sem dúvida que necessitamos de um salto em infra-estrutura, acho que alguma coisa melhora. Para este ano e começo do ano que vem não vejo possibilidades de investimentos que tragam alívio para o setor do agronegócio, principalmente.
Paraná Cooperativo - E toda esta discussão sobre Alca, União Européia ou Mercosul?
Mendonça de Barros - Sou bastante crítico com a posição com relação a Alca (Área de Livre Comércio das Américas), acho que é uma negociação difícil não devemos ter nenhuma ilusão que nós não ganhamos nenhum presente de Papai Noel, mas acho que não podemos ficar de fora desta negociação. Está ficando muito lento, tímida esta discussão e isto me preocupa. Sou da opinião de que temos que negociar com todas as frentes. O Mercosul tem problemas em si, está cada vez mais difícil de fato uma harmonia interna pelas diferenças entre os parceiros. A negociação com a Europa acho importantíssima. Temos que negociar com todo mundo, afinal o Brasil exporta para todos os continentes, sabemos que iremos conseguir menos de alguns parceiros e mais de outros, tudo é questão de negociarmos.
Paraná Cooperativo - No seu entender o atual cenário econômico e político contribui para uma possível reeleição do presidente Lula?
Mendonça de Barros - Certamente que a reeleição é a lógica do regime presidencialista e provavelmente o presidente eleito tenha em seu projeto este fato. Creio que seja cedo para avaliarmos isto, mas creio que tudo depende de uma retomada mais forte do crescimento, especialmente, do mercado interno o que não está acontecendo ainda. Acho que esta será uma dúvida que irá permanecer entre nós, pelo menos até meados de 2005, após as eleições municipais e do desempenho da economia.
Paraná Cooperativo - Como o senhor vê a presença das cooperativas no desenvolvimento do País?
Mendonça
de Barros - Conheço o sistema cooperativista há muitos anos,
quando cuidei de uma Fazenda e fui cooperado em Mandaguari, norte do Estado
e sei que o cooperativismo é importante para o desenvolvimento do Paraná.
E creio que hoje é mais importante ainda do que há 30 anos atrás.
O sistema compatibiliza uma infra-estrutura fundiária razoável
e não tão concentrada como em outras regiões, com espaço
para crescer e acho que ele joga um papel decisivo e espero que continue assim
por muitos anos.