DESPERDÍCIO, ROÇA E RENDA

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Roberto Rodrigues

Ainda falta um ano e meio para o governo FHC terminar, de modo que é um pouco cedo para fazer um balanço completo do seu desempenho. Mas já se pode ter uma boa idéia dele e talvez a palavra mais adequada para defini-lo seja desperdício. É inegável que o Presidente Fernando Henrique conseguiu extraordinários avanços nestes 7 anos. A estabilização da moeda, o ajuste fiscal, a retomada dos assentamentos rurais, a lei de responsabilidade fiscal, as privatizações, entre outros, são pontos mais que conhecidos.

Mas, o Presidente, desperdiçou talento nas privatizações ao deixar muitas dúvidas como, por exemplo, o uso de recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) para financiar empresas estrangeiras para comprar ótimas estatais como a Vale do Rio Doce, ou áreas estratégicas, como a energética, que não investiu e nos deixou no escuro. Além disso, onde estão a fundamental reforma tributária, a reforma política, o ajuste previdenciário? E, sobretudo, onde está um plano de desenvolvimento? O Presidente tem desperdiçado inteligência, sua cultura, carisma e liderança, atendendo a um grupo de ministros burocratas. Gente séria, bem intencionada (mas, como sabemos, o inferno está cheio deles), cuja grande preocupação é fazer fluxo de caixa. Toda empresa precisa de um bom contador, mas ela só vai para a frente se tiver gente visionária, capaz de criar condições de investimentos para gerar receita, emprego, produção.O mesmo é necessário com governos.

O que lhe faltou então, para FHC fazer um governo que o colocaria na posição de um líder mundial? Teve apoio popular, teve apoio no Congresso, teve tudo para fazer um governo fantástico e desperdiçou a oportunidade.

Quem sabe ? No caso específico da agricultura, a explicação pode ser claramente compreendida através de um incidente político. Recentemente, o Presidente, desgostoso com a atuação de um determinado partido da base aliada, disse que os integrantes deste partido possuidores de cargos no governo deveriam "tomar o caminho da roça". É o subconsciente funcionando? É assim que ele vê a agricultura, como um setor marginal, atrasado , o desterro ideal para desafetos. Desconsidera que o agronegócio representa 25% do total da produção nacional, gera 37% dos empregos do país e 40% das nossas exportações, sendo o único grande setor superavitário da balança comercial. Por isto não implantou as Dez Bandeiras do Agronegócio definidas, a seu pedido, pelo Fórum Nacional da Agricultura que ele mesmo criou.

Menos mal que, neste resto de governo, e graças ao esforço extraordinário do Ministro Pratini de Morais, da Agricultura, temos um pouco mais de crédito para a safra 2001/2002. Mérito para o Ministro que venceu as barreiras da área econômica. Mas o Presidente, mais uma vez, errou quando disse que, com este recurso, a agricultura realizaria seu antigo sonho de produzir 100 milhões de toneladas. O sonho é dele. Porque os agricultores sonham em produzir 300, 400 milhões de toneladas e alimentar o mundo todo. Mas, para tanto, é preciso uma política de renda para o campo. E isto já é um problemão para os burocratas, porque implica em desenvolvimento ...

Não se pode, contudo, perder a esperança pois ainda há tempo para fazer coisas definitivas, como o seguro rural e subvenções sociais para o pequeno produtor. Além disso, o Presidente continua inteligente, culto, tem poder e tem feito um discurso muito bom no que tange às negociações internacionais (OMC, Alca). Vale lembrar, ainda, que haverá eleição no ano que vem, e, para ganhá-la , é preciso fazer coisas que gerem emprego, produção, renda, impostos, excedentes exportáveis e riqueza para o País. E FHC sabe que só a agropecuária e os agronegócios podem fazer isto com rapidez. (OESP - SUPLEMENTO AGRÍCOLA - 25.07.2001)

*Roberto Rodrigues é engenheiro agrônomo e agricultor, presidente da ACI - Aliança Cooperativa Internacional e da ABAG - Associação Brasileira de Agribusiness e professor de economia rural da UNESP/Jaboticabal.

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