As dificuldades na implementação de uma política econômica de estabilidade e crescimento

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As dificuldades na implementação de uma política econômica de estabilidade e crescimento

(*) Robson Leandro Mafioletti

Quase 10 anos apos a implantação do Plano Real (1.994) vai se confirmando a impressão de que é extremamente difícil juntar o sucesso da estabilização, ou seja, do controle inflacionário a um ritmo de crescimento econômico mais acelerado que promova aumento de emprego e bem-estar da população como um todo.

Uma aceleração no crescimento da economia brasileira poderia comprometer as exportações devido ao aumento da demanda interna pelos produtos que seriam exportados, essa maior taxa de crescimento também acarretaria em aumentos de importações; de ambas as formas, os fluxos de divisas para o País ficaria comprometido.

Acredita-se ainda que a alternativa das desvalorizações, além das dificuldades operacionais num regime de flutuação como o brasileiro, pode resultar numa ruptura do controle inflacionário [1] (um exemplo é a grande volatilidade e desvalorização do câmbio ocorrida no segundo semestre de 2002 com o US$ 1,00 = R$ 4,00, o que propiciou o aparecimento acelerado da inflação no final deste ano).

Estudo realizado pelo CEPEA órgão vinculado a ESALQ/USP, analisou os impactos da desvalorização cambial e do crescimento econômico sobre o saldo comercial do agronegócio brasileiro. No estudo foi demonstrado que o volume das exportações do agronegócio é bem menos sensível ao câmbio do que as importações, a razão é de aproximadamente 3 para 1.

A desvalorização reduz severamente o valor das importações do agronegócio, isso é interessante por apontar um caminho para economia de divisas, porém reduções muito grandes de importações podem comprometer o próprio desempenho do setor, principalmente pelo encarecimento dos insumos essenciais para o seu crescimento, como exemplo as importações de fertilizantes no período analisado 1990 a 2002 aumentou em 190% e pela não modernização do setor, com a aquisição de bens como máquinas e equipamentos mais sofisticados.

Da mesma maneira, a evolução da atividade econômica brasileira impacta de forma mais acentuada as importações do agronegócio do que suas exportações. A razão entre esses impactos pode chegar a 4 para 1. Isso significa que o crescimento mais acelerado da economia brasileira tenderá a agravar o saldo comercial do agronegócio mais pelo lado das importações (que cresceriam) do que das exportações (que diminuiriam).

Os resultados sobre câmbio e PIB revelam em conjunto que haveria a possibilidade de através da desvalorização cambial, abrir-se caminho para um crescimento mais acelerado da economia. O grosso dos ajustes se daria via importações, como por exemplo, se o PIB crescer 5,00%, uma desvalorização real de 6,10% manteria o saldo comercial do agronegócio inalterado. 

O AGRONEGÓCIO BRASILEIRO E O SALDO DA BALANÇA COMERCIAL

O agronegócio tem sido fundamental sob vários aspectos para a economia brasileira, como:

Ø      O PIB do setor é de R$ 450,00 bilhões, o que representa 35% do PIB Brasileiro;

Ø      37% dos empregos da população economicamente ativa;

Ø      Exportações de US$ 30,6 bilhões o que representa 42% das exportações totais brasileiras.

A revolução tecnológica na agropecuária foi alcançada graças ao aumento de produtividade no período de 1990 a 2003, segundo estimativas do IPEA esse aumento foi de 68,00%. Principais motivos foram o empreendedorismo dos produtores rurais brasileiros, aliado ao melhoramento genético e melhor adaptação de variedades e raças, otimização na utilização dos insumos e recursos, disponibilização por parte do Governo Federal (BNDES) de linhas de financiamento para investimentos no processo produtivo, propiciou entre outras melhorias principalmente a modernização do parque de máquinas e equipamentos, aumento da dotação de recursos para custeio e comercialização. Na comercialização o Governo implementou novas políticas como EGF, PEP, LEC e contratos de opção de venda que beneficiaram o setor produtivo e não oneraram os cofres públicos com elevados estoques públicos, além de forte participação das empresas privadas nos financiamentos de custeio e comercialização da safra.

O desempenho do agronegócio particularmente após o Plano Real proporcionou queda real de mais de 20% dos preços dos alimentos aos consumidores, que muito beneficiou a sociedade como um todo, principalmente as camadas mais pobres da população, além de ter facilitado a manutenção das baixas taxas de inflação observadas no período. Proporcionou saldos comerciais de US$ 8,00 a US$ 25,00 bilhões/ano, atenuando, assim os déficits comerciais que de outra forma poderiam tornar-se insuportáveis para o País. 

Quadro 01 ? Evolução da balança comercial brasileira 1990 ? 2003 (valores em bilhões de US$)

Ano

Exportações

Importações

Saldo

1990

31,40

20,70

10,80

1991

31,60

21,00

10,60

1992

35,79

20,55

15,23

1993

38,55

25,26

13,29

1994

43,55

33,08

10,47

1995

46,51

49,97

- 3,46

1996

47,75

53,34

- 5,59

1997

52,99

59,75

- 6,75

1998

51,14

57,76

- 6,62

1999

48,01

49,29

- 1,28

2000

55,08

55,84

- 0,75

2001

58,22

55,57

2,65

2002

60,36

47,24

13,12

2003*

73,10

48,30

24,80

                        Fonte: Mdic/Secex/2003, * provisório ? Elaboração: Ocepar/Getec

Quadro 02 ? Evolução da balança comercial do agronegócio brasileiro ? 1990 ? 2003 (valores em bilhões de US$)

Ano

Exportações

Importações

Saldo

1990

12,99

3,18

9,81

1991

12,40

3,64

8,76

1992

14,45

2,96

11,49

1993

15,94

4,16

11,78

1994

19,10

5,67

13,43

1995

20,87

8,61

12,26

1996

21,14

8,94

12,20

1997

23,40

8,24

15,16

1998

21,57

8,10

13,47

1999

20,51

5,70

14,77

2000

20,61

5,80

14,81

2001

23,86

4,80

19,02

2002

24,84

4,49

20,35

2003*

30,60

4,80

25,80

                                 Fonte: Mdic/Secex/2003, * provisório, Elaboração: Ocepar/Getec.

Como pode ser observada no quadro 02 as exportações do agronegócio cresceram no período de 14 anos 137,21%, ou seja, média aritmética de 9,80% ao ano, enquanto as importações cresceram somente 50,94%, ou seja, média aritmética de 3,64% ao ano, resultando num crescimento do saldo da balança comercial do agronegócio de 162,99% no período dos 14 anos.

O saldo comercial sofreu forte incremento a partir de 2.000 como resultado da desvalorização cambial ocorrida em janeiro de 1.999 e das excelentes safras agrícolas ocorridas aliada a preços remuneradores e a capitalização dos produtores em virtude das renegociações de dívidas (Securitização, Pesa e Recoop). Essas dívidas foram ocasionadas pela valorização cambial que perdurou de 1.995 a 1.998, e que garantiu o sucesso do Plano Real com importações muito baratas e sacrifício do setor produtivo primário.

(*) Engenheiro Agrônomo Assessor Técnico e Econômico da Ocepar

             



[1] O conceito de inflação mais comumente utilizado é do aumento persistente e generalizado nos níveis de preços da economia

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