Artigo: O campo não quer favor, clama justiça

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Dilceu Sperafico(*)

A interpretação de que o agricultor quer anistia de dívidas, recursos a fundo perdido ou algum tipo de privilégio do Governo, está equivocada e é injusta. A população das grandes cidades pode não saber, mas nós que vivemos no interior e conhecemos o trabalho e a seriedade do homem do campo, estamos conscientes destas verdades.

O produtor busca apoio e não favor. Reivindica tratamento adequado à sua contribuição para o desenvolvimento econômico e bem-estar social do País. Aos que consideram a promessa de três bilhões de reais para a renegociação de débitos do agricultor um tipo de benesse, não custa lembrar que em 2004 o agronegócio respondeu por 39,4% das exportações e quase totalidade do superávit de 35,6 bilhões de dólares na balança comercial brasileira.

Para dimensionar melhor este resultado basta recordar que a contribuição de todos os demais segmentos produtivos ficou em 2,1 bilhões de dólares. A agropecuária é responsável também por 37% dos empregos gerados no campo e nas cidades e 30% do Produto Interno Bruto (PIB) do País, sem falar no abastecimento do mercado interno, com a oferta de alimentos abundantes, saudáveis e baratos para toda a população. Isto tudo demonstra que a crise no campo afeta toda a economia nacional. A dificuldade do agricultor ameaça também o emprego do trabalhador urbano. Para dimensionar esta relação, a Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA), realizou pesquisa em todo o País.

Através do Projeto Conhecer foram entrevistados 2.298 produtores, constatando a gravidade da crise de renda no meio rural. Sem renda, o agricultor não paga dívidas, não recolhe tributos, não consome e não investe na atividade, atingindo o poder público, o comércio, a indústria e as empresas de prestação de serviços. O levantamento mostrou que depois de enfrentar a frustração de safra devido à estiagem e queda nos preços das commodities, entre outras dificuldades, os agricultores não têm condições de quitar débitos, incluindo, em muitos casos, os financiamentos de custeio. Metade dos produtores compromete toda sua renda somente com o pagamento do custeio da lavoura.

O problema é que ficam para trás as dívidas com fornecedores de insumos, parcelas de empréstimos de investimentos e da renegociação de débitos antigos, além das necessidades de sobrevivência da família. Nada menos que 36% dos entrevistados têm compromissos com fornecedores particulares que não poderão ser quitados. Para completar o quadro de dificuldades, apenas 11% já conseguiram renegociar dívidas de custeio, 12% de investimentos e 30% de recursos obtidos através de lançamento de Cédula de Produtor Rural (CPR). O Governo têm conhecimento da situação do campo, pois vimos denunciando as dificuldades há muito tempo e já conseguimos diversas medidas destinadas à renegociação de dividas, mas a pesquisa comprova que elas têm sido insuficientes para reverter a crise no campo.

Parte desta situação pode ser explicada por outra revelação da pesquisa da CNA. Dos 49,2% dos agricultores que solicitaram financiamento para custeio da lavoura, somente 8% obtiveram a totalidade dos recursos a juros de 8,75% ao ano. Os demais tomaram empréstimos a taxas mais elevadas, aumentando os custos de produção, comprometendo a renda e abrindo caminho para a crise da atualidade. A seca e a queda do dólar e dos preços das commodities são responsáveis por boa parcela das dificuldades do campo, mas as taxas de juros e a falta de maior apoio oficial ao setor, também têm culpa nesta situação. Nós, agricultores e moradores do interior, estamos cansados de saber dessa realidade.

(*) Dilceu Sperafico é deputado federal pelo Paraná.

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