Painéis do Seminário Jurídico debatem regimes específicos
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Encerrando a programação do V Seminário Jurídico do Sistema OCB, que ocorreu terça-feira (09/09), três painéis simultâneos reuniram especialistas, dirigentes e tributaristas para debater como os regimes específicos da Reforma Tributária vão impactar diretamente o cooperativismo nos setores de crédito, saúde e agropecuário. A proposta foi trazer um olhar prático sobre a Lei Complementar já aprovada e abrir espaço para a troca de experiências entre advogados, assessores jurídicos, contadores de cooperativas e das OCEs e acadêmicos da área.
Os debates aconteceram em um momento crucial, já que a transição para o novo modelo de tributação sobre o consumo começa a ganhar forma. Para o Sistema OCB, acompanhar cada detalhe dessa implementação é essencial para assegurar que as especificidades do ato cooperativo sejam preservadas e que as cooperativas mantenham sua competitividade em relação aos demais agentes de mercado.
Instituições financeiras
No painel sobre instituições financeiras, o debate foi conduzido pelo superintendente jurídico do Sicredi, Evandro Kotz, e contou com a exposição de Hélio de Mello, auditor fiscal da Receita Federal e membro titular do GT-3 do PAT-RTC. Hélio destacou os desafios globais de tributar serviços financeiros, especialmente aqueles remunerados por margem, como no crédito bancário. “Diferenciar os juros puros da remuneração de serviços é fundamental para evitar distorções e garantir neutralidade ao sistema”, afirmou.
O auditor lembrou que, embora a maioria dos países adote o modelo de isenção, o Brasil avançou ao rejeitar essa alternativa. A isenção, segundo ele, gera graves distorções econômicas, como a sobretributação do crédito empresarial e a subtributação do crédito ao consumo. “Optamos por uma solução mais próxima do que já conhecemos com o PIS/Cofins, o que preserva segurança jurídica e garante continuidade”, explicou. Para ele, ainda que não seja um modelo perfeito, o caminho escolhido oferece mais previsibilidade às instituições financeiras, incluindo as cooperativas de crédito.
A relevância do tema ficou clara nas perguntas dos participantes, que trouxeram preocupações sobre como a regulamentação poderá afetar a neutralidade do ato cooperativo e a competitividade das cooperativas de crédito em relação aos bancos. Kotz destacou o papel desses espaços de diálogo. “Estamos todos aprendendo juntos nesse processo. O que importa é garantir que as especificidades do cooperativismo estejam sempre no centro das soluções construídas”, afirmou.
Custos assistenciais
O setor de saúde também esteve em pauta, com moderação do advogado tributarista João Muzzi e palestra do Doutor André Branco, da Uniodonto. O grupo discutiu os efeitos da nova tributação sobre os custos assistenciais e a sustentabilidade das cooperativas médicas. André Branco destacou que o princípio da não tributação de determinadas atividades cooperativas já é reconhecido há anos, mas sua aplicação ainda gera controvérsias. “O grande desafio é lidar com a complexidade regulatória, que muitas vezes cria obstáculos práticos para que os direitos constitucionais das cooperativas sejam plenamente aplicados”, avaliou.
Ele lembrou que as cooperativas operadoras de planos de saúde já enfrentam um ambiente desafiador, com custos crescentes e a necessidade de manter a lógica mutualista no atendimento. Nesse contexto, segundo ele, a Reforma Tributária pode trazer tanto riscos quanto oportunidades. “Assim como navegar sem mapa em uma cidade desconhecida, lidar com leis tributárias pouco claras pode levar cooperativas a erros caros. Precisamos de clareza para seguir em frente”, reforçou. Os debates conduzidos pelo Doutor João Muzzi ressaltaram a importância de a agenda política e jurídica se manter atenta, para evitar que o novo modelo crie custos adicionais que possam comprometer a sustentabilidade das cooperativas médicas.
Produtor rural contribuinte e não contribuinte
Já o painel sobre o setor agropecuário foi moderado por Rogério Croscato, coordenador jurídico da Ocepar, e teve apresentações dos advogados tributaristas Doutor Fábio Calcini e Doutor Marcelo Jabour. O foco esteve na operacionalização da alíquota zero entre cooperados contribuintes e não contribuintes e as cooperativas e nos impactos da transição para o IVA. Os especialistas lembraram que o agronegócio brasileiro é altamente competitivo no mercado internacional e não pode ser prejudicado por uma tributação mal calibrada.
“A reforma tributária é um verdadeiro quebra-cabeça coletivo. Se uma peça não encaixar, todo o sistema pode perder equilíbrio”, afirmou Calcini, ao comentar a necessidade de regulamentações claras e de transição suave para as novas regras. Jabour complementou destacando a importância de preparar produtores e cooperativas para o novo cenário. “As mudanças exigirão ajustes contábeis, adaptação de estratégias e, sobretudo, proximidade ainda maior entre cooperativas e seus associados, para garantir conformidade e competitividade”, disse.
Visão unificada
Ao final dos debates, os participantes se reuniram novamente no plenário para a conclusão e compartilhamento dos painéis simultâneos, momento conduzido pela assessora jurídica do Sistema OCB, Ana Paula Ramos. Ela destacou que a divisão em salas paralelas buscou aprofundar a especialização, atendendo tanto profissionais jurídicos quanto contábeis dos oito ramos do cooperativismo, e que o retorno ao plenário foi essencial para reunir visões distintas em uma lógica única. “O cooperativismo se rege por uma lógica societária própria, que impacta todas as demais dimensões, inclusive a tributária. Por isso, é fundamental que todos compreendam as discussões em sua totalidade”, reforçou.
Ana Paula também registrou agradecimento especial aos moderadores que, segundo ela, “desde 2019 vêm se dedicando integralmente ao estudo das questões tributárias do cooperativismo, construindo de forma coletiva soluções para garantir segurança jurídica e sustentabilidade às cooperativas”. Em sua fala, enfatizou a importância da participação ativa de cooperativas na base, das Organizações Estaduais (OCEs) e do Sistema OCB nacional no processo que resultou na aprovação da reforma. “Se não foi a reforma sonhada, foi a possível, construída com diálogo e protagonismo do cooperativismo”, complementou.
Síntese
O encontro foi encerrado com a síntese das contribuições apresentadas nos três painéis, seguida de um sorteio de livros jurídicos entre os participantes. A atmosfera final foi de reconhecimento mútuo pelo esforço coletivo que envolveu dirigentes, advogados, técnicos e cooperativas de todo o país. Como destacou Ana Paula, o trabalho não termina com a aprovação da lei. “Temos ainda um longo caminho na regulamentação. Mas o cooperativismo está pronto para seguir unido, vigilante e colaborativo, honrando sua essência e seu compromisso com o desenvolvimento sustentável.” (Sistema OCB)