GRÃOS: Soja que interessa ao produtor e ao investidor

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Forte demanda na China, quebra de safra na Argentina e uma boa dose de especulação. Está pronta a receita para valorizar os preços dos grãos. É, afinal, essa combinação de fatores que carrega para cima os mercados da soja e do milho na Bolsa de Chicago (CBOT) neste ano. Em alta desde o início de março, os dois grãos registraram perdas em maio, quando notícias sobre os primeiros focos de gripe A (H1N1) derrubaram os mercados, mas que foram devolvidas com troco no final de abril.

Valorização - Desde então, a soja teve valorização de quase US$ 3 por bushel (27,2 quilos), passando da casa dos US$ 8 em março para mais de US$ 11 em maio - próximo de US$ 25 a saca de 60 quilos. O milho, que há dois meses estava cotado a pouco mais de US$ 3 o bushel (25,4 quilos), hoje vale mais de US$ 4 - perto de US$ 9,5/saca. Entre vale e pico, as variações do período foram de 38% e 25%, respectivamente.

Boato - O mercado comprou (caiu) o boato de pandemia, vendeu (subiu) o fato de que a demanda está firme e a oferta apertada, e os preços retornaram aos níveis de setembro (soja) e outubro (milho). As cotações internacionais ainda estão abaixo da máxima da metade do ano passado (-30% na oleaginosa e -42% no cereal), mas acumulam alta de quase 50% desde dezembro.

Final de 2008 - No final do ano passado, após o estouro da crise financeira mundial e da debandada de capital especulativo das commodities, a soja caiu a US$ 7,8 e o milho foi a US$ 2,9. Isso depois de chegar a, respectivamente, US$ 16,5 e US$ 7,5 em junho de 2008.

Petróleo - O sobe-desce dos grãos foi acompanhado de perto pelo petróleo. Depois de alcançar recordes US$ 145 em julho de 2008, o preço do barril do tipo WTI caiu a US$ 33,87 em dezembro na Bolsa Mercantil de Nova York (Nymex). Hoje, oscila entre US$ 55 e US$ 60.

Motivos - Essa correlação de preços entre grãos e petróleo não acontece por acaso, explica Daniele Siqueira, analista da AgRural. O primeiro motivo, fundamental, é a competição entre esses produtos (petróleo para gasolina, óleo de soja para bicombustível e milho para etanol). O segundo motivo é especulativo. A queda do dólar no mercado internacional encoraja os investidores a comprar ativos ligados a commodities, agrícolas e não agrícolas, que oferecem menor risco e maior retorno.

Correlação - A correlação de preço entre os mercados financeiros e de commodities também tem crescido ao longo do tempo. Hoje, a ligação entre os preços da soja na CBOT e do índice S&P 500 em Nova York (um dos preferidos pelos investidores) é de 70%, conforme levantamento da AgRural. A sinergia entre o grão e o combustível já foi mais forte - chegou a 90% no segundo semestre do ano passado -, mas ainda existe. Hoje, fica em torno de 60%, calcula Daniele. Correlação mede a força ou o grau de relacionamento entre duas variáveis. Quanto maior o coeficiente, maior a relação.

Hedge - Termômetro da presença de capital especulativo nas bolsas, o número de contratos movimentados pelos fundos hedge tem crescido gradualmente. Eles têm em mãos 27,6 milhões de toneladas de soja, segundo levantamento da AgRural. Se fossem precisar do produto, teriam que comprar quase metade da safra atual brasileira ou um terço da norte-americana. Os fundos hedge podem inflar artificialmente os preços dos ativos, como ocorreu na metade do ano passado, e não fosse por eles a soja não estaria acima de US$ 10 o bushel, assegura Leonardo Menezes, analista da Céleres. Desta vez, porém, diferente de 2008, não é uma bolha, garantem os analistas.

Sinal - "A ação desses fundos é uma sinalização das apostas com dinheiro. No médio prazo, eles respeitam os fundamentos", considera Pedro Collussi, da AgraFNP. O analista da Cerealpar Steve Cachia concorda que a alta da soja mistura fundamentos e especulação, e destaca para a possibilidade de ralis ainda maiores nos próximos meses. A confiança está voltando e os fundos estão comprando, afirma. Para Cachia, existe risco, mas os fundamentos são positivos. A avaliação considera fatores como demanda aquecida, quebra na safra sul-americana e estoques apertados.

Fundamentos  - O  bom desempenho dos preços das commodities parece incoerente em meio à recessão econômica global, mas está longe de ser meramente especulativo. No caso da soja, a elevação das cotações internacionais responde ao que os analistas chamam de choque de oferta. Há dois anos o mundo produz menos soja do que consome.

Recessão -Em 2009, a recessão econômica vai reduzir em 3% a demanda pelo grão, mas a produção mundial, que já havia sido deficitária no ciclo anterior, vai cair 4%. Como resultado, os estoques mundiais do grão recuarão ao mais baixo nível dos últimos cinco anos no ciclo 2008/09.

Estoques - "Mesmo que a safra 2009/10 seja cheia no mundo todo, ainda assim não será suficiente para recompor os estoques", calcula Pedro Collussi, analista da AgraFNP. O excedente mundial de soja, que chegou a ser superior a 60 milhões de toneladas em 2007, será de apenas 42,5 milhões de toneladas no ciclo 2008/09. A relação entre estoque e consumo, que alcançou confortáveis 28% há dois anos, despencou para 19% neste ano. Os dados são do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA).

Confirmação - O aperto dos estoques é notícia de janeiro e se confirma a cada nova estimativa de safra da Argentina, considera a analista da AgRural Daniele Siqueira. A safra do país vizinho tinha potencial para 50 milhões de toneladas, mas vai render pouco mais de 30 milhões. A projeção é revisada para baixo semanalmente pela Bolsa de Cereais de Buenos Aires. Na semana passada, caiu, de uma vez só, 600 mil toneladas, para 32, 2 milhões. "Entre Argentina e Brasil, serão pelo menos 20 milhões de toneladas a menos", calcula Leonardo Menezes, da consultoria Céleres. O cálculo do analista considera uma quebra de 16 milhões de toneladas na produção argentina e de 4 a 5 milhões no Brasil. A safra brasileira de soja vai recuar a 57,6 milhões de toneladas, segundo a Companhia Nacional do Abastecimento (Conab).

Quebra - A quebra da safra sul-americana apertou ainda mais um quadro que já era justo. Enquanto a oferta cai mais que o esperado, a demanda recua menos que o previsto. A previsão do USDA é que o consumo mundial de soja se retraia 3% neste ano, mas a China, maior importador do grão do mundo, continua comprando como nunca. "Os chineses vão continuar priorizando o milho e comprando soja. A capacidade de esmagamento deles é muito grande. Tem espaço para que as importações aumentem entre 2 e 3 milhões de toneladas por ano", calcula Collussi. (Caminhos do Campo / Gazeta do Povo)

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