Expansão agrícola na região dos cerrados
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Os mais recentes números da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) para a safra brasileira de grãos em 2001 trazem informações importantes e interessantes. Em primeiro lugar, está o tamanho da safra, que deverá alcançar 97,4 milhões de toneladas. Poucos, antecipadamente, arriscavam uma previsão superior a 90 milhões de toneladas. O aperfeiçoamento tecnológico na produção de grãos e o clima favorável contribuíram para esse ótimo desempenho. Tivemos uma safra de 37,2 milhões de toneladas de soja e de 41 milhões de toneladas de milho. A produção de algodão continuou em crescimento,, enquanto a de trigo deverá mostrar uma significativa recuperação. O lado negativo está sendo marcado pelos declínios nas produções de arroz e feijão, nossos importantes produtos alimentares.
Em segundo lugar,. é preciso ressaltar nossa produção recorde de soja, como mencionado, de 37,2. milhões de toneladas, marcando uma continuada expansão nos últimos anos. Esse é mais um caso de sucesso, em condições adversas, internas externas, de um produto da agropecuária brasileira. A produção brasileira de soja representa, neste ano 2 1,4% da produção mundial, perdendo apenas para a produção dos Estados Unidos, esta carregada de subsídios governamentais Esse sucesso pode sei mais bem avaliado com as seguintes informações: no triênio 1961/63, o Brasil produziu apenas 313 mil toneladas de soja; no triênio 1970/72, apenas 2,3 milhões de toneladas. Trata-se, portanto, de um produto novo em nossa economia agrícola, ao contrário de café, cana-de-açúcar, fumo e cacau, tradicionais culturas de exportação.
Ao lado dessa expressiva expansão de nossa produção de soja,. destaca-se a mudança de sua localização geográfica. Cultura que teve seu início no Rio Grande do Sul, com a variedade Santa Rosa, nome de tradicional município gaúcho, ela foi se expandindo por Santa Catarina, Paraná, São Paulo e, graças ao pioneiro trabalho dos pesquisadores da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), chegou aos estados da região Centro-Oeste e à região dos cerrados. Esse esforço científico-tecnológico dessa nossa instituição de pesquisa agronômica merece todo o reconhecimento nacional.
Considerando-se os estados de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Bahia, Minas Gerais, Maranhão, Piauí, Tocantins, Rondônia. Distrito Federal e Pará, uma aproximação à região de cerrados, a produção de soja em 2001 alcançou 20,2 milhões de toneladas, correspondendo a 54,1% da produção total brasileira. Mato Grosso tornou-se o principal estado produtor, superando os precursores Rio Grande do Sul e Paraná, inclusive em produtividade, com 3.100 kg(ha, resultado superior à média dos Estados Unidos.
Entretanto, esse excelente desempenho da soja na região CentroNorte, basicamente a região dos cerrados, começa a ficar comprometido pelos baixos preços no mercado internacional e pelos elevados custos do transporte rodoviário aos portos de Paranaguá, Santos e Tubarão. Os preços internacionais estão sendo negativamente pressionados pela penetração das variedades transgênicas e pelos subsídios da política agrícola norte-americana. No Brasil, as variedades transgênicas estão proibidas em razão das iniciativas de entidades ambientalistas, de defesa dos consumidores, ONGs e de respostas positivas do Judiciário. Como resultado, os produtores brasileiros não se beneficiam das reduções de custos de produção, o que, se acontecesse, melhoraria nossa capacidade de competição no mercado internacional. Adicionalmente, os Estados Unidos estão contemplando um substancial aumento do preço mínimo aos produtores de soja em sua nova legislação agrícola.
De outro lado, mas de modo muito parecido, os projetos governamentais de solução do gargalo do transporte rodoviário, por meio do programa Avança Brasil, encontram as mesmas aposições, pelas mesmas entidades, adicionando-se às questões iniciais um suposto problema indigenista. Esses projetos trariam urna expressiva redução nos custos de transporte da soja aos portos das regiões Norte e Nordeste, o que aumentaria a remuneração aos produtores da região Centro-Norte. Não é por acaso que os produtores norte-americanos temem os resultados dos ganhos de competitividade da soja brasileira. Os preços aos nossos produtores poderiam aumentar em cerca de US$ 20-30/tonelada nos estados daquela região.
Além da Ferronorte (ligação ao Sudeste) e da hidrovia do Rio Madeira, existem os projetos Rio Tocantins ? ferrovia Norte/Sul ? ferrovia Carajás de um lado e, de outro, Rio Araguaia ? rodovia Xambioá/Estreito ? ferrovia Norte/Sul ? ferrovia Carajás. Mais ainda, existem os projetos da hidrovia Teles Pires ? Tapajós e o asfaltamento da BR- 163 (porto de Santarém). O estudo ?Preços agrícolas?, de Guimarães Costa e Caixeta Filho, publicado em janeiro deste ano, confirma os impactos econômicos favoráveis desses projetos para a expansão da soja na região dos cerrados. Segundo eles, ?a soja tende a ocupar, principalmente, as áreas já desmatadas (pecuária e agricultura de corte e queima) e, em segundo lugar, desmatar as áreas de cerrado, o que mantém o processo tradicional de expansão da fronteira agrícola brasileira?. Esse comentário nos remete a uma questão final: será que os problemas ambientalistas indigenistas são as verdadeiras razões para essa bem organizada oposição à nossa expansão agrícola na região dos cerrados? Afinal, temos, ainda, 90 milhões de hectares a serem economicamente aproveitados nos cerrados.
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(*) Professor titular do Departamento de Economia da PEA-USP e pesquisador da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe).(Artigo publicado no Jornal Gazeta Mercantil edição 21.08.2001)